Entre os formandos que se preparam para sair da Universidade Tiradentes (Unit) e ingressarem no mercado de trabalho está Nathália Martins. Ela possui uma deficiência visual que não a limita, muito pelo contrário, a fez protagonista de uma história de superação: concluiu o curso de Psicologia, uma área complexa, em que a visão parece imprescindível à compreensão dos sentimentos dos outros.
Nathália iniciou a graduação em 2017. Ela conta que veio do município de Penedo, em Alagoas, para estudar. “Quando eu decidi fazer o vestibular não tinha o curso de Psicologia na minha cidade. Eu tinha duas opções: prestar o vestibular para Maceió ou para Aracaju. Fiz as provas e passei para a Unit, e foi assim que começou a minha jornada. Tive muita dificuldade no início, mas também tive pessoas que me ajudaram, me acolheram em suas casas. Isso foi algo muito bacana que fizeram por mim e que me ajudou na adaptação”, relembra.
No início do curso ela teve problemas para acompanhar o ritmo do restante da turma. “Logo no início não tinham equipamentos mais avançados para me ajudar nos estudos. Tinha um scanner que era usado para transcrever textos para o braille. Mesmo que aqui na Unit tivesse essa máquina, era algo muito fora da minha realidade. O braille não é muito acessível, ainda mais para mim que vim de uma cidade pequena que não existia esse recurso. Era mais trabalhoso passar todo o conteúdo para o braille. Mas os professores me ajudaram muito com os materiais didáticos. Eles sempre foram muito prestativos comigo e entendiam a minha situação. Ainda bem que hoje existem outras tecnologias que facilitam muito no aprendizado”, conta.
As tecnologias foram uma grande aliada para que Nathália prosseguisse os estudos. “Os professores me mandavam os textos em PDF, o que facilitava muito para mim porque eu tinha acesso a outros recursos, como por exemplo, o leitor de texto. Mas no decorrer do curso a Unit foi adquirindo equipamentos mais avançados e também tinha profissionais como o ledor/transcritor que acompanha durante as aulas. Antes disso eu fazia as minhas provas no Núcleo de Apoio Pedagógico e Psicossocial (NAPPS) com um monitor. Eles sempre me deram o suporte necessário, além de trazer novas ferramentas que me ajudassem no processo de aprendizagem”, diz.
Para ela o estágio foi uma época muito boa. “Finalmente iria colocar em prática o que aprendi na teoria. Mas durante as práticas me aconteceu uma situação de uma paciente desistir de continuar o atendimento comigo. Isso me deixou muito triste. Foi bem angustiante e foi inevitável não relacionar essa rejeição a minha deficiência, mas depois entendi que isso é normal. O paciente tem esse poder de escolher se deseja ou não continuar com o atendimento. Até porque vai além da minha deficiência, entre questões de identificação, de gosto e até mesmo de aceitar que precisa continuar na terapia. Na Psicologia aprendemos que existem vários fatores que faz com que uma pessoa desista do tratamento”, salienta.
Mesmo com diversas dificuldades ela concluiu a graduação em junho deste ano. E agora o desafio é entrar no mercado de trabalho. “Execer a profissão é outro desafio. Quando a gente termina a graduação vem a questão de montar escritório, buscar especialização. E tudo isso exige recurso financeiro. Esse é o primeiro desafio, mas não é algo que me desmotive ou me faça desistir. Eu acho que durante o percurso do exercício da profissão é que de fato irão aparecer os desafios. O início é difícil pra todo mundo. Pra mim existe o receio do paciente não querer meus atendimentos por causa da minha deficiência visual. Porque é comum que as pessoas queiram ser notadas visualmente, e esse será de fato um grande desafio. Mostrar que a minha deficiência não é limitante, pelo contrário, me torna mais empática”, salienta.
Nathália e sua família vieram para Aracaju devido aos seus estudos e não tem planos de retornar para Penedo. “A mudança aconteceu porque seria mais fácil para que estudasse. Meu irmão também iniciou a graduação na Unit. Então eu, meu irmão e meus pais ficamos de vez aqui. Já estamos bem familiarizados e aqui tem mais oportunidades do que a minha cidade natal”, comenta.
Para o futuro Nathália deseja exercer a Psicologia em suas várias áreas. “Pretendo ficar aqui porque há mais possibilidades de arrumar emprego na minha área, mas também estarei abraçando outras oportunidades. Também quero investir em uma especialização em Psicodrama porque é a área que mais me identifico. O Psicodrama trabalha técnicas mais visuais que se assemelham muito ao teatro. Apesar de eu ser tímida e possuir uma deficiência visual, é uma abordagem que eu me identifiquei bastante. Eu tive uma excelente preceptora que me estimulou muito. Os professores que tive sempre me mostraram caminhos para me tornar a profissional capacitada que sou”, conclui.
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