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Como o mercado de energia elétrica é afetado pelas mudanças no clima

Ondas intensas de calor registradas em fevereiro e março fazem disparar os picos de demandas no Sistema Interligado Nacional, que também registra excessos de produção em alguns momentos

às 12h58
Linhas e redes de transmissão de energia elétrica podem ser muito afetadas por situações e fenômenos climáticos (Fábio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)
Linhas e redes de transmissão de energia elétrica podem ser muito afetadas por situações e fenômenos climáticos (Fábio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)
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O final do verão 2023/2024 foi marcado por uma disparada no consumo e na demanda por energia elétrica, o que já começa a causar preocupação não apenas entre as autoridades e os especialistas do setor elétrico, mas também nos que acompanham a evolução das alterações climáticas provocadas pelo aquecimento global. De acordo com dados do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), houve um recorde na demanda máxima de carga de energia do Sistema Interligado Nacional (SIN), às 14h37 do dia 15 de março. 

Neste dia, tal demanda chegou a 102.478 megawatts (MW) e foi atendida por 92,5% de energia sustentável. No mesmo dia, houve recorde de carga média no valor de 91.338 MW. Um detalhe: este recorde já tinha sido quebrado duas vezes antes do resultado mais recente: no dia 7 de fevereiro deste ano (101.860 MW) e em 14 de novembro do ano passado (101.475 MW). O ONS aponta as ondas de calor recordes registradas no Brasil como causadores dessa quebra sucessiva de recordes na demanda instantânea de carga. 

Para o professor Cristiano da Silva Vieira, docente dos cursos de Engenharia Mecânica, Engenharia Elétrica e Engenharia Mecatrônica da Universidade Tiradentes (Unit), tais ondas de calor, assim como as quedas repentinas de temperatura (causadas principalmente pelas chuvas e frentes frias), provocam aumento da demanda de energia porque as pessoas recorrem mais aos sistemas de aquecimento ou resfriamento. Ele frisa que há outros fatores envolvidos na questão, como a retomada das operações normais de empresas e escolas, o crescimento econômico de determinada região, aumento da atividade industrial e mudanças nas preferências dos consumidores, como o aumento no uso de eletrônicos, veículos elétricos ou a adoção de novas tecnologias que consomem energia. 

“Se houver uma alta dependência de fontes de energia renovável, como a solar ou eólica, a demanda de energia pode variar dependendo das condições climáticas que afetam a produção dessas fontes de energia. Se houver uma escassez temporária de vento ou luz solar, a demanda por energia de outras fontes pode aumentar para compensar essa lacuna. Estes são apenas alguns dos fatores que podem contribuir para uma demanda recorde de energia em março, particularmente no final do verão. A interação complexa entre esses fatores pode variar dependendo da região e das condições específicas do mercado de energia”, aponta Cristiano. 

Sobre a real capacidade do sistema elétrico brasileiro de suprir a demanda de energia, Vieira explica que ela varia ao longo do tempo e depende de vários fatores, incluindo a disponibilidade de recursos energéticos, capacidade de geração, eficiência da infraestrutura de transmissão e distribuição, políticas energéticas e condições climáticas. “O Brasil possui um mix diversificado de fontes de energia, incluindo hidrelétricas, termelétricas, eólicas, solares e biomassa. As hidrelétricas historicamente têm sido a principal fonte de geração de energia do país, respondendo por uma parcela significativa da capacidade instalada. No entanto, a dependência das hidrelétricas torna o sistema elétrico brasileiro sensível às variações climáticas, como secas prolongadas, que podem afetar a disponibilidade de água para geração de energia”, detalha.

Em excesso

A variedade de fontes de energia acaba gerando uma situação contraditória no sistema elétrico, que também preocupa os especialistas: o “excesso” de produção de energia elétrica, que muitas vezes precisa ser “jogado fora” porque não consegue ser distribuída ou armazenada. É algo que pode ser ainda mais recorrente nos próximos anos, como já prevê o próprio ONS: em 2028, o Brasil terá uma oferta de 281,56 gigawatts, contra uma demanda 2,5 vezes menor: de 110,98 gigawatts. 

Segundo o professor da Unit, isso acontece devido a fatores como a geração intermitente de energia solar ou eólica (que depende das condições climáticas de cada dia), as atuais limitações de armazenamento de baterias ou outras tecnologias, sistemas de transmissão de energia com baixa capacidade e distorções das políticas de mercado em algumas regiões, nas quais alguns produtores preferem pagar para consumir sua carga, em vez de desligar as geradoras. 

“Para aproveitar o excesso de energia, podem ser exploradas várias estratégias, como o desenvolvimento de tecnologias de armazenamento de energia mais avançadas, a expansão da capacidade de transmissão de energia, o incentivo ao uso de veículos elétricos e a implementação de políticas que promovam a flexibilidade na geração e no consumo de eletricidade”, sugere Cristiano, acrescentando que, “embora o sistema elétrico brasileiro tenha capacidade para suprir a demanda de energia em muitas circunstâncias, é importante continuar monitorando e investindo na infraestrutura para garantir a segurança e confiabilidade do fornecimento de energia”.

‘Novo normal’?

Como já vinha sendo alertado há muito tempo pelos ambientalistas, o aquecimento da temperatura média do planeta Terra pode tornar os fenômenos climáticos, como ondas de calor mais intensas, secas prolongadas ou eventos de vento, enchentes e tempestades, cada vez mais frequentes e constantes, fazendo com que a população mundial tenha que se adaptar a eles. O mesmo pode acontecer com o cenário energético. 

Os novos padrões, de acordo com Cristiano, podem influenciar o aumento da geração de energia renovável, o uso de sistemas de resfriamento (nas ondas de calor) e de aquecimento (frio extremo), e o impacto desses fenômenos na rede de transmissão e distribuição de energia, como já aconteceu recentemente em cidades como São Paulo (SP) e Porto Alegre (RS), que enfrentaram falta de energia por mais de 100 horas em alguns bairros. 

“Diante desses desafios, é crucial investir em infraestrutura resiliente, tecnologias de armazenamento de energia avançadas e estratégias de gestão de energia flexíveis para lidar com a variabilidade crescente na geração e na demanda de energia. Além disso, políticas de mitigação das mudanças climáticas, como a redução das emissões de gases de efeito estufa e o aumento da eficiência energética, são fundamentais para enfrentar os desafios associados ao aumento dos efeitos das mudanças climáticas no setor de energia”, finaliza o professor.

com informações de G1 e Agência Brasil

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