O verão está chegando e promete intensificar ainda mais o calor e as altas temperaturas. Isso aumenta a demanda do público por soluções que vão muito além do ventilador, do ar-condicionado ou mesmo da boa e velha “sombra e água fresca”. Elas podem estar nos chamados “telhados verdes”, que permitem o plantio de plantas e vegetação nos telhados de residências e edificações, contribuindo para a diminuição da temperatura.
Uma adaptação desta modalidade de telhado está sendo desenvolvida em uma disciplina prática dos cursos de Engenharia da Universidade Tiradentes (Unit), o que já resultou em um artigo publicado na edição mais recente da revista científica PPC (Políticas Públicas e Cidades), editada em Curitiba (PR). O artigo, intitulado Do brownfields para o brown roof: uma análise preliminar como alternativa ao telhado verde, foi escrito pelo estudante Charles Roberto Santos de Abreu, do curso de Engenharia Civil, e pelo professor Arionaldo Rodrigues Menezes, responsável pela disciplina.
O estudo adaptou os telhados verdes que foram criados em 2007 por cientistas da Universidade de Birmingham, no Reino Unido. A proposta é colocar, nas lajes e telhados, camadas de terra e substrato, reproduzindo os terrenos degradados nos quais crescem alguns tipos de plantas e vegetações mais simples. Charles explica que a ideia inicial do estudo foi adaptar o que já foi testado nos estudos britânicos e em outros experimentos realizados em Sydney, na Austrália, que comprovaram a redução das temperaturas dos imóveis onde o telhado transformado em “terreno baldio” foi implantado.
“Eles não propuseram [o telhado] com as condições ambientais da gente aqui no Nordeste. A proposta deles foi semelhante às condições climáticas numa cidade australiana, e na literatura não tem nada específico. No nosso caso, se eu utilizo a vegetação nativa análoga à região catalogada, como o mato ou o capim, e se e ela suporta aquela adversidade ambiental, com pouca chuva no ponto escolhido ou bastante chuva pela manhã, e mesmo assim eles conseguem sobreviver no terreno baldio, por que não copiar no telhado e assim atender alguns aspectos do telhado verde, como redução de temperatura, e contribuir com o paisagismo e vegetal da região?”, instiga Charles.
O ponto de partida para o experimento foi a casa de um dos alunos integrantes da equipe, no bairro São José, em Aracaju, que mora vizinho a um terreno baldio. “A ideia foi pegar essas plantas que tem no terreno baldio e plantar essas mudas na parte do telhado em cima para ser um telhado sustentável. Além de sustentável, ele será econômico, porque são plantas nativas da região e não vai se gastar muito com irrigação, nem ter despesa para comprar mudas. A única coisa que vai ter que ter atenção é com a questão da poda e ter o controle para evitar o surgimento de pragas”, explica o professor Arionaldo.
As plantas utilizadas no estudo são típicas da Mata Atlântica e do Cerrado brasileiro, com aparecimento mais frequente em locais degradados de Aracaju: a erva de Santa Luzia, a quebra-pedra, a tiririca, a pé-de-galinha e a corda-de-viola, que podem se adaptar tanto ao tempo seco quanto ao chuvoso. Outro aspecto favorável é a ocorrência de chuvas na região estudada, que segundo a meteorologia, tende a ser mais intensa pelas manhãs e entre os meses de abril e julho. Estes fatores contribuem para uma significativa redução dos custos de implantação e manutenção dos telhados verdes. “Teoricamente, a gente tem que, além de fazer toda a metodologia de impermeabilização, hidratar [o local] o tempo todo como uma grama. Só que na cobertura, nesse caso, você utiliza a vegetação nativa análoga. Não é algo esteticamente bonito como uma grama verde-esmeralda, mas é uma contribuição que dá para aproveitar, e a custo praticamente zero, com a irrigação da própria chuva”, afirma Charles.
Política pública
O artigo científico com todos os detalhes do projeto desenvolvido na Unit foi estudado e redigido em 40 dias. Em seguida, ele foi submetido e aprovado para publicação na revista PPC, especializada nas áreas de engenharia, arquitetura e urbanismo. Fundada em 2014 por estudantes de pós-graduação da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), ela evoluiu para um periódico científico não-institucional, independente de qualquer associação acadêmica específica, e está classificada com o nível A3 do índice Qualis Capes, que mensura o impacto científico e a qualidade teórica dos artigos publicados.
“A revista é bastante conhecida na área de sustentabilidade e tem uma pegada voltada às políticas públicas e cidades. São artigos que propõem caminhos sustentáveis e aplicáveis nas cidades de modo geral. E o nosso artigo encaixou direitinho, por ser em Aracaju e ser testado no bairro São José. O que nós estamos fazendo é uma coisa real, que foi escrita e agora vamos transformar em prática com os alunos. A nossa proposta é oferecer um telhado que seja sustentável e permita que você não gaste muito com a parte de estrutura e climatização”, considera Arionaldo.
Os trabalhos de desenvolvimento do protótipo e de testes práticos estão em andamento e devem ser apresentados ao encerramento da disciplina, em 29 de novembro. Além de Charles, outros quatro alunos dos cursos de Arquitetura e Urbanismo e das outras Engenharias participam da equipe que trabalha no desenvolvimento do telhado brown roof. “Em termos mundiais, o meio ambiente é cada vez mais uma preocupação, e a ideia é sempre reduzir o consumo. É bem interessante a gente colaborar com um projeto inovador, para que possa ter algo novo para a sociedade e para outras pessoas que eventualmente se interessam sobre o assunto”, dizem os alunos Hugo Leonardo Peçanha Júnior, de Engenharia Elétrica, e Mateus Marques, de Engenharia Mecatrônica.
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