O Conselho Nacional de Justiça, por meio Comissão Permanente de Democratização e Aperfeiçoamento dos Serviços Judiciários, lançou na segunda-feira, 22, o livro ‘Democratizando o Acesso à Justiça’. A publicação reúne 12 artigos com propostas apresentadas por magistrados, professores e juristas durante evento realizado em 30 de julho de 2020.
Entre os painelistas que integram a obra está o doutor Ilzver Matos, professor do Mestrado em Direitos Humanos da Universidade Tiradentes, que elaborou o artigo “Povos de terreiro, liberdade religiosa e acesso à justiça”
Com a proposta de analisar o fenômeno do racismo religioso e verificar a qualidade do diálogo existente entre as comunidades tradicionais de terreiro e o sistema de justiça em Sergipe, Ilzver Matos parte da ideia de que o sistema de justiça acumula cinco benefícios que partilha narcísica e historicamente com a elite branca racista brasileira, com quem se identifica majoritariamente.
“O benefício da ignorância, o benefício do cinismo, o benefício da apatia, o benefício da escravidão e o benefício do extermínio. Esses benefícios dificultam a abertura de espaços para a compreensão das especificidades dos povos de terreiro pelo sistema de justiça e gera atos administrativos e judiciais que, no lugar de protegerem os direitos e garantias constitucionais, convencionais e legais desses povos – que são patrimônio histórico e cultural do país – questionam e põem em risco os direitos e a existência dessas comunidades. Tais comunidades, assim, têm se colocado no espaço público para disputar essas narrativas e influenciar a agenda pública do sistema de justiça – sem desconsiderar os demais poderes instituídos”, pontua.
Em seu artigo, Ilzver Matos cita ainda a convenção 169, assinada em Genebra, em 27 de junho de 1989, e ratificada pelo Brasil em 2002, a Constituição Federal de 1988 – que reconhece direitos a comunidades indígenas, afro-brasileiras, quilombolas e a outros grupos e comunidades que participaram do processo civilizatório nacional; a experiência dos povos de terreiro de Sergipe na atualidade e o caminho muito longo a percorrer para que o sistema de justiça compreenda que tais comunidades merecem um maior reconhecimento; a judicialização da religiosidade dos povos tradicionais de terreiro no Estado e apresenta uma carta das comunidades de terreiro em resistência para o sistema de justiça de Sergipe.
Em seu conteúdo, o pesquisador provoca ainda algumas reflexões sobre a inserção dos Povos e Comunidades Tradicionais no orçamento público e garantia de chamamentos públicos específicos para suas ações e projetos, tais como, propostas de mapeamento socioeconômico, inventários de bens materiais e imateriais, de fomento à valorização dos sacerdotes e sacerdotisas, legalização dos terreiros que assim o queiram; propiciar o ensino da história e cultura da África e dos afrobrasileiros nas escolas, tudo, com vistas ao enfrentamento do racismo religioso em Sergipe.
Além de a garantia de representação dos povos e comunidades tradicionais nos conselhos federais, estaduais e municipais relevantes para suas demandas e a criação da Secretaria Estadual de Igualdade Racial e Combate à Intolerância Religiosa, de Conselhos de Promoção da Igualdade Racial, Secretarias e Diretorias ligadas ao tema e que combatam a violência religiosa, o racismo e a discriminação, em todos os municípios do Estado de Sergipe, bem como dos seus respectivos Planos Municipais de Promoção da Igualdade Racial e Combate à Intolerância, além da Comissão Estadual de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais no Estado de Sergipe, de acordo com o previsto no Decreto n. 6.040/2007.
“Desde 2011 acompanhamos casos de racismo religioso através das pesquisas que desenvolvemos no Grupo de Pesquisa Políticas Públicas de Proteção aos Direitos Humanos do PPGD UNIT, em parceria com a OAB Sergipe, a Sociedade Omolàyié, o Fórum Sergipano de Religiões de Matriz Africana e outros grupos. Através desse acompanhamento prestamos assistência jurídica e assessoria aos povos de terreiro nos casos em que seus direitos são violados. O artigo traz um panorama desse trabalho e aponta propostas para a superação do quadro de violação de direitos humanos dos povos de terreiro em Sergipe”, ressalta.
Publicação
Sob a coordenação da magistrada Flávia Moreira Guimarães Pessoa, Conselheira Presidente da Comissão Permanente de Democratização e Aperfeiçoamento dos Serviços Judiciários, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) realizou em julho de 2020, por videoconferência, o evento ‘Democratizando o acesso à justiça’. A publicação traz a compilação dos textos e propostas apresentados em palestras proferidas nos painéis.
“O evento que contou com a participação de aproximadamente, duas mil pessoas foi estruturado em painéis, iniciando-se pelo painel intitulado “Democratização do Acesso à Justiça”, seguido por aqueles que trataram da “Democratização do Acesso à Justiça: a experiência internacional”; “Despesas Processuais e Assistência Processual Gratuita” e, por último, o painel que abordou o tema “Preconceito, Desigualdade de Raça, Gênero, Condição Física, Orientação Sexual, Religiosa, Interseccionalidades e Acesso à Justiça”, revela a Conselheira do CNJ, Flávia Pessoa, no prefácio da obra.
De acordo com a Conselheira, os diferentes posicionamentos enriquecem a obra que, além de estimular reflexões, disponibiliza propostas viáveis, que podem ser alcançadas ou até já se encontram em implementação nos tribunais.
“A publicação reúne textos que debatem a questão do acesso igualitário aos serviços jurisdicionais. Os participantes apresentam valiosas reflexões sobre este tema, tão atual quanto desafiador, que é a democratização do acesso à Justiça”, diz a professora do curso de mestrado em Direito da Universidade Tiradentes, Flávia Pessoa.
A publicação está disponível para download no link a seguir: DEMOCRATIZANDO O ACESSO À JUSTIÇA
Com informações Agência CNJ de Notícias