A expressão “remar contra a maré” traz entre seus significados o enfrentamento de grandes desafios. Ele se tornou literal e concreto há cerca de cinco anos na vida de Gleide Medeiros, colaboradora do setor de Multimeios da Biblioteca Central Jacinto Uchôa de Mendonça, na Universidade Tiradentes (Unit). Prestes a completar 60 anos de idade e 29 de casa, ela passou pelo tratamento contra um câncer de mama e entrou em fase de remissão da doença. E uma das suas maiores fontes de força e motivação para superar esse desafio vem da prática da canoagem.
Gleide é uma das participantes de uma equipe do grupo de apoio “Mulheres de Peito”, que participa do 2º Festival Nacional de Dragon Boat, competição de canoagem que reúne mulheres que fizeram tratamentos contra a doença e praticam o esporte como exercício de recuperação corporal. O evento acontece entre os dias 24 e 27 de outubro (de quinta a domingo), em Brasília (DF). O time sergipano, do qual ela faz parte junto com outras 21 mulheres, embarcou para a capital federal na noite da segunda-feira, 21.
A colaboradora da Unit conta que começou a fazer parte da equipe de canoagem em 2020, a partir da recomendação que lhe foi feita por uma amiga de infância, que estava se tratando contra um câncer de mama. “Dois anos se passaram e eu tive câncer de mama também. Aí ela me disse que estava fazendo esse esporte e me chamou para participar. Fui, fiquei e gostei demais, porque é um esporte de superação”, disse Gleide, explicando que os exercícios da canoagem são indicados para mulheres que passam por cirurgias de mastectomia, isto é, retirada parcial ou total da mama e dos linfonodos nas axilas. “Quando a gente faz a mastectomia, perde um pouco a mobilidade do braço, que incha e incomoda. A prática de canoagem ajuda muito na recuperação e na autoestima”, detalha.
A ideia da equipe de canoagem tomou forma a partir de 2016, quando duas alunas do curso de Educação Física da Unit apresentaram um projeto à ONG Mulheres de Peito, propondo a inclusão do esporte nas atividades de assistência às mulheres assistidas. A ideia foi sendo aprimorada e começou a ser posta em prática em 2019, quando as primeiras aulas de canoagem foram ministradas por dois voluntários. Desde então, a equipe Mulheres de Peito se reúne duas vezes por semana para realizar seus treinos, em um atracadouro no Parque dos Cajueiros, às margens do Rio Poxim, em Aracaju.
Os percursos são realizados no chamado dragon boat (“barco do dragão”), um tipo de canoa chinesa que agrupa mais de 20 remadoras. A Mulheres de Peito é uma das mais de 240 equipes filiadas à IBCPC (International Breast Cancer Paddlers Comission), entidade internacional que coordena a prática do esporte por mulheres sobreviventes de câncer de mama em 30 países.
A caminhada
O esforço e o cansaço dos exercícios se sobrepõem ao trauma vivido desde 2019, quando Gleide recebeu o diagnóstico da doença. “O meu mundo caiu, porque a gente fica pensando: ‘Meu Deus, como é que vai ser minha vida daqui para frente?’ Eu mesmo só pensei em coisa ruim, mas não no decorrer do tratamento, pois vi que eu tinha que reagir. Eu tenho uma filha e uma família que me apoiou muito. Eu fui me fortalecendo a cada dia e tomei posse disso para mim”, relembra, acrescentando que, passou primeiro por sessões de quimioterapia e radioterapia antes e depois da mastectomia.
O câncer chegou a ter uma recidiva, isto é, a volta do tumor, em 2022, o que exigiu outras sessões de radioterapia. Gleide conseguiu se recuperar e está agora na fase de remissão, que é a diminuição máxima dos sintomas e dos sinais de tumores, até a cura completa. Uma caminhada difícil, na qual ela seguiu ao lado da família, do marido e da filha de 28 anos. Gleide contou ainda com o apoio dos colegas e dos gestores da Unit, que lhe deram todo o suporte durante o tratamento e também nas competições com a equipe de canoagem.
“A gente sempre fala que a Unit é uma empresa muito humanizada, vê os nossos colaboradores superando desafios e sempre tem que dar esse apoio. É fundamental para a equipe que se sente valorizada, respeitada, com as oportunidades que são oferecidas e com esse apoio que a instituição dá nessa questão. Aqui é uma família, que está todo mundo junto, sempre se apoiando. A Gleide é um elo importante nessa corrente. Uma colega super empenhada, super engajada, mais uma que soma na equipe”, elogia a gestora da Biblioteca, Gislene Maria Dias.
Relembrar essa trajetória de superação emociona a colaboradora, a cada vez que se junta às companheiras de equipe para singrar as águas e superar não apenas os percursos, mas também o próprio câncer e o sofrimento causado por ele. “É uma sensação de liberdade é de dizer: ‘Obrigada, Deus! Eu venci e estou viva!’ Vejo também o brilho no olhar das minhas amigas, essa superação delas, aquela sensação de liberdade e de vitória… É muito bom. Eu não sei nem descrever, mas é emocionante demais”, tenta dizer Gleide, com a voz embargada de emoção, mas com a certeza de vai vencer muitas outras marés pela frente.
Leia mais:
Câncer de mama: estudo revela impacto da nutrição na saúde de pacientes