A saúde mental e cognitiva é um dos pilares fundamentais para uma qualidade de vida plena, especialmente com o aumento da expectativa de vida global. Ao longo das últimas décadas, a prevalência de demências tem se tornado uma preocupação crescente em nível mundial. Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) revelam que cerca de 55 milhões de pessoas vivem com algum tipo de demência, e esse número pode triplicar até 2050.
Essa condição debilitante não impacta apenas a qualidade de vida do paciente, mas também sobrecarrega significativamente os sistemas de saúde e as famílias. De acordo com o médico neurologista e professor da Universidade Tiradentes (Unit), Dr. Helton Benevides, os principais fatores de risco estão relacionados ao estilo de vida e comorbidades.
A boa notícia é que diversas medidas podem ser tomadas para reduzir os riscos e promover uma melhor saúde cerebral. “Controlar doenças crônicas como diabetes e hipertensão arterial, cessar o tabagismo, reduzir o consumo de álcool e adotar uma dieta saudável são fundamentais. Essas medidas não apenas evitam complicações mais agudas como o Acidente Vascular Cerebral (AVC), mas também oferecem proteção”, destaca o médico neurologista.
A importância dos hábitos saudáveis
Dr. Helton pontua que alimentação balanceada e prática regular de exercícios físicos têm um impacto direto na prevenção de demências. “Alimentos saudáveis são indubitavelmente benéficos, pois proporcionam alta qualidade de matéria-prima nutricional para o órgão mais importante do corpo: o cérebro. Além disso, o exercício físico melhora o fluxo sanguíneo cerebral e, consequentemente, o aporte energético. Ele também promove a liberação de citocinas importantes para os mecanismos de autorregulação da insulina e da glicose no corpo celular, reduz os radicais livres e ativa neurotransmissores e fatores neurotróficos que atuam no sistema límbico, auxiliando no controle do humor, da dor e da recompensa”, elenca.
Embora não haja um tipo de exercício específico comprovadamente superior, atividades aeróbicas mostraram maiores benefícios na prevenção de doenças neurodegenerativas. “Ter hábitos regulares de exercício acaba tendo melhores benefícios, sendo sugerido fazer o exercício que a pessoa se sinta bem. Início gradual com progressão, com intuito de gerar um hábito. Um parâmetro que pode ser usado, sob orientação, é o aumento do Volume de oxigênio máximo (VO2máx)”, recomenda.
Controle de doenças crônicas e sono de qualidade
O controle de doenças como diabetes e hipertensão é essencial para prevenir as demências mais prevalentes, como o Alzheimer e a Demência Vascular. “A proteção contra a Demência Vascular consiste, principalmente, em reduzir os efeitos lesivos que essas doenças causam nos vasos intra e extracranianos. Além disso, busca-se minimizar o risco de depósitos de proteínas mutantes que, por meio de mecanismos ainda incertos, podem levar à morte celular precoce”, alerta.
Outro fator crucial é a qualidade do sono. Algumas dicas incluem:
- Consulte um especialista: Procure ajuda médica se enfrentar dificuldades para dormir ou se apresentar sono não restaurador, que pode estar associado à Apneia do Sono, uma condição com riscos cardiovasculares e cerebrais.
- Estabeleça horários regulares: Mantenha um horário fixo para dormir e acordar todos os dias.
- Evite o uso de telas: Não utilize dispositivos eletrônicos, como TV, celular ou tablet, ao se deitar.
- Modere o consumo de estimulantes: Reduza a ingestão de cafeína (café, chá preto ou mate, refrigerantes) e álcool, especialmente à noite.
- Prepare-se para o sono: Reserve 30 minutos antes de dormir para organizar seus pensamentos, anotar tarefas importantes ou planejar o dia seguinte.
- Evite exercícios noturnos: Não pratique atividades físicas intensas muito próximas ao horário de dormir.
- Levante-se se não conseguir dormir: Se não adormecer em 20 a 30 minutos, levante-se e realize uma atividade leve, como ler, meditar ou tomar um chá verde, até o sono retornar.
Impacto do isolamento social e da depressão
A socialização regular e o engajamento em grupos são fatores-chave para uma longevidade saudável. “O isolamento e a apatia, frequentemente associados a quadros depressivos, potencializam o surgimento de quadros demenciais. Por isso, participar de grupos (como corrida, dança, música, bate-papo, terapia, academia, associações, entre outros) é fundamental para alcançar uma longevidade saudável. Geralmente, o tratamento do quadro depressivo, tanto medicamentoso quanto, principalmente, não medicamentoso, como psicoterapia, exercícios físicos e grupos de apoio, são pontos-chave para evitar a progressão para quadros demenciais”, orienta.
Consumo de álcool e tabaco
O tabagismo é um fator de risco significativo para demências, enquanto o consumo de álcool deve ser evitado ou minimizado. “O tabagismo, independentemente do tipo, deve ser discutido para cessação o mais rápido possível. Ele, por si só, é um grande fator de risco isolado, ou seja, não precisa de outros fatores para causar demência. Com relação ao álcool, embora existam publicações que mencionem doses mínimas ou toleráveis, é sempre recomendável evitar o consumo. Muitas das permissões são sugeridas para manter uma socialização mínima, com ingestão moderada (como 1 ou 2 taças de vinho em eventos sociais, por exemplo)”, relata.
Identificando os sinais de alerta
Existem alguns sinais iniciais que as pessoas devem observar e que indicam a necessidade de buscar acompanhamento médico para prevenção ou tratamento precoce e essas mudanças de padrões são e devem sempre ser acompanhados por profissional médico. “Nunca se deve considerar como normal o esquecimento. Esquecimentos persistentes, principalmente quando causam prejuízo ou têm potencial para prejudicar, seja no cotidiano, seja no convívio pessoal (como repetir histórias várias vezes, não lembrar do que acabou de conversar ou de pessoas próximas), devem ser avaliados. Mudanças comportamentais, como apatia inexplicada, euforia, agitação ou até o uso de palavras (ou comentários) e gestos inapropriados, merecem sempre uma avaliação”, orienta Helton Benevides.
Por mais que a maioria dos casos de demência não tenha relação genética até então, manter os mesmos padrões de estilo de vida com alimentação inadequada com consumo de ultraprocessados e “fast food”, sedentarismo, baixa reserva cultural e cognitiva, uso de telas de forma excessiva, problemas no sono, não acompanhamento das doenças crônicas ou uso irregular de medicações contínuas são vários dos pontos que se forem corrigidos reduzem o risco de desenvolver alguma síndrome demencial com o passar dos anos.
Para os jovens vale lembrar que o envelhecimento saudável ele começa antes de envelhecer, onde ter hábitos saudáveis é mais fácil, uma vez que as complicações e os riscos ainda são menores para se fazer as mudanças necessárias. “Mudar hábitos ruins não é uma tarefa simples e requer boa-vontade, disciplina, amor próprio e resiliência. Pensar num futuro longevo saudável deveria ser o nosso principal projeto”, finaliza o neurologista.
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