As artes plásticas também simbolizam a cultura e a identidade de um povo, revelando grandes talentos e expoentes. Em Sergipe, um destes nomes é J.Inácio, que através de suas telas e cores, expressou muito mais que paisagens, florestas ou pequenos povoados, mas também a alma e a gente do nosso estado. Uma expressão que tornou-se muito conhecida e apreciada em galerias e coleções do Brasil e do mundo.
J. Inácio era o pseudônimo de José Inácio Alves de Oliveira, que nasceu em 11 de junho de 1911, no povoado Bolandeira, em Arauá (região sul de Sergipe). Era o mais novo de quatro irmãos, sendo um deles o Padre Pedro, sacerdote católico que ficou muito conhecido em Aracaju por seu trabalho religioso com pessoas adoentadas e comunidades mais pobres.
O envolvimento com a arte veio aos 18 anos, mas através do teatro: interpretou o papel de Judas Iscariotes em um auto da Paixão de Cristo, encenado na Colina do Santo Antônio, em Aracaju. Um ano depois, em 1930, entrou de vez no mundo da pintura e da caricatura. A partir das aulas que teve com seu primeiro mestre, o pintor e matemático Quintino Marques, produziu seus primeiros quadros e começou a trabalhar para jornais e revistas da cidade. Na mesma época, escrevia poemas e os vendia nas ruas, com o pseudônimo ‘Inácio Ventura’.
Em 1931, J.Inácio fez a sua primeira exposição, na antiga Biblioteca Pública de Aracaju. O seu talento foi ganhando destaque e chamou a atenção do governo do Estado, que concedeu a ele uma bolsa de estudos para a então Escola Nacional de Belas Artes (Enba), atual Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro (EBA/UFRJ). A passagem pela então capital federal durou pouco mais de um ano, mas rendeu uma grande amizade com outro sergipano: Jordão de Oliveira (1900-1980), que foi aluno, professor e catedrático da Enba, além de consagrado como artista, poeta e escritor.
Foi o conterrâneo quem o acolheu em sua casa e lhe deu o maior incentivo para seguir em frente na carreira artística, através de conselhos, ensinamentos e materiais para pintura. Assim, Inácio complementava a sua formação artística, que “foi no laboratório da vida, na experiência vivida, nas dificuldades do dia a dia”, como define o crítico e curador de arte Mário Britto. Voltou em 1940 ao Rio, onde fez uma exposição individual no Liceu de Belas Artes. Nos anos seguintes, participou do Salão de Artes Plásticas do Rio de Janeiro e recebeu dois prêmios: a medalha de bronze, em 1943, e a Menção Honrosa, em 1944.
Ao longo das décadas seguintes, suas obras e escritos foram ganhando mais reconhecimento e admiração de colecionadores e admiradores do Brasil e até mesmo do exterior. No entanto, preferia levar uma vida mais simples, sem se apegar a bens ou vaidades. Isso não impediu que ele recebesse mais homenagens ainda em vida. Em 1981, foi nomeado patrono da Galeria de Arte da Biblioteca Pública Epifânio Dórea, em Aracaju. Em 1988 e no ano 2000, recebeu comendas da Ordem do Mérito Serigy, concedida pela Prefeitura de Aracaju.
Em 2004, ganhou o Diploma de Personalidade Cultural, da União Brasileira de Escritores (UBE), e foi tema da mostra “Visitando J. Inácio”, da Sociedade Semear, que reuniu outros 21 artistas sergipanos para fazer releituras de suas principais obras. J. Inácio morreu em Aracaju, no dia 1º de agosto de 2007, aos 96 anos, mas sua obra continuou a ser lembrada. Em 2010, ele foi patrono do 19º Salão dos Novos, promovido pela Galeria de Artes Álvaro Santos. E em 2011, foi tema de exposição em homenagem ao seu centenário de nascimento, no Tribunal de Contas do Estado de Sergipe (TCE/SE) e do livro “Vida e Obra de J. Inácio”, escrito por Wagner Ribeiro.
Legado de sua obra
O professor Rony Rei do Nascimento Silva, do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPED) da Universidade Tiradentes (Unit), destaca que os quadros e telas de J. Inácio trazem cores locais e estabelecem uma identidade que marca sua contribuição às artes plásticas do nosso estado, passando por uma linguagem subliminar expressionista.
“A irreverência, aliada à sua inquietude, fez dele um artista singular, livre de conceitos, de estilos, de temas e de escolas. Suas obras, realizadas com pinceladas firmes, rápidas e certeiras, têm um colorido muito exclusivo, são cores vibrantes e luminosas, com predominância dos verdes e amarelos. Entre as suas maiores fontes de inspiração, estavam as garças, as jaqueiras, as casas de farinha, os pântanos, as paisagens urbanas e rurais de diversos municípios sergipanos, retratos de amigos e personalidades. Suas bananeiras, objeto de desejo de todos os colecionadores, são o símbolo maior de sua iconografia”, cita Rony.
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