A Universidade Tiradentes (Unit) possui o maior ossário forense da América Latina. São 680 ossadas destinadas a pesquisas científicas, estudos anatômicos e forenses por parte dos estudantes dos cursos da Saúde, entre eles Medicina, Enfermagem e Odontologia. O local também recebe pesquisadores de outras instituições brasileiras e de fora do País.
Segundo o coordenador do Laboratório de Anatomia Humana da Unit, Glauquer Sávio Alves da Silva, poucas universidades possuem um ossário desse porte. “Essa é uma coleção realmente rara. Aqui, nós temos tudo registrado e organizado para facilitar a vida do pesquisador. Com essa quantidade eu posso receber alunos de qualquer instituição do mundo porque é dado suficiente para qualquer pesquisa. E isso é de grande importância para a universidade”, disse.
As peças individuais são catalogadas manualmente e digitalmente e organizadas em prateleiras expositivas ou caixas organizadoras. As ossadas completas também são inventariadas e armazenadas em urnas. Cada uma delas possui uma ficha onde constam informações como medidas morfológicas e que registram até mesmo, doenças raras. “São muitos dados diversificados. Temos catalogadas 25 patologias que não são tão simples de achar. Por exemplo, eu tenho ossadas com espondilite anquilosante. Achar um indivíduo com essa doença é muito difícil”, contou o coordenador.
Todas as ossadas destinadas aos estudos dos alunos passam por um procedimento de limpeza com diversas substâncias. “Lavamos com água e uma escova de nylon para tirar qualquer sujeira, depois colocamos em um tanque com hipoclorito puro a 13% e cal virgem. Tampamos o tonel e deixamos por 24 horas. No outro dia, colocamos em um tanque com peróxido de hidrogênio que vai servir para complementar a ação do hipoclorito e clarear a peça para ficar mais visível, facilitando o estudo do aluno”, explicou Glauquer.
Após o processo de limpeza química, os ossadas são levadas ao sol e envernizadas para protegê-las, evitando que se desgastem com o manuseio, além de embelezá-las.
Já o ossuário destinado às pesquisas de antropologia forense passam por um processo mais simples de limpeza, para que as substâncias químicas não retirem qualquer evidência do material. “O hipoclorito e o peróxido provocam desgaste no osso. Então, alguma evidência que possa ter na mandíbula, por exemplo, pode ser movida pela ação dos produtos. E se eu removo o dado, não consigo investigar, não consigo realizar o estudo”, esclareceu.
Fundadores
No início, a coleção contava com 180 ossadas, a maior parte delas trazidas da Bahia. O início da implantação se deu pelo professor Erasmo de Almeida Júnior, juntamente com diretor da Saúde, Hesmoney Santa Rosa, e os professores Francisco Prado Reis, ex-direitor e ex-coordenador geral de perícias do Instituto Médico Legal (IML) de Sergipe, José Aderval Aragão, parceiro desde a idealização, implementação e funcionamento do curso de Medicina.
Pesquisa
Atualmente, estão em andamento seis pesquisas no laboratório. Uma delas é a análise de variação do nervo milo-hióideo, localizado na base da língua. Em algumas pessoas, ao invés do nervo alveolar inferior, esse é o principal tendão que inerva os dentes, e pode causar dificuldades em procedimentos odontológicos, como a falta de sensibilidade à anestesia.
“Em 40% a 46% da população, os dentes são inervados pelo nervo milo-hióideo. Essa é uma variação altíssima. Por isso, fizemos uma revisão da literatura. Desde 1915 o nervo milo-hióideo é relatado, mas notamos que não há muitos que falam dessa variação. Há somente um livro em que consta. Mas, se ela existe, porque se fala tão pouco sobre ela?”, questionou o coordenador.
Para constatar a condição, foram analisadas 240 mandíbulas, entre os ossários provenientes da Bahia e de Sergipe, para verificar a variação de acordo com os estados. Até o momento, foi constatada 52% de variação do milo-hióideo nas ossadas baianas e o próximo passo será a análise das sergipanas, levando em consideração também as etnias.
*Matéria atualizada em 27/01/2022, quinta-feira, às 09:02.
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