As discussões sobre a Previdência Social no Brasil são frequentemente marcadas por um tom alarmista, com muitos afirmando que o envelhecimento da população e a redução das taxas de natalidade levarão ao colapso do sistema. No entanto, essa visão pode ser exagerada, visto que ajustes constantes estão sendo realizados para garantir sua continuidade. O desafio é real, mas longe de ser intransponível.
De acordo com a contadora e coordenadora do Núcleo de Apoio Contábil e Fiscal da Universidade Tiradentes (NAF-Unit), professora Flávia Karla Gonçalves, o impacto causado pelo envelhecimento populacional representa um grande desafio, mas não é exclusivo do Brasil. “Quando a expectativa de vida aumenta e as taxas de natalidade caem, o número de idosos dependentes da previdência cresce. Ao mesmo tempo, a força de trabalho ativa, que financia o sistema por meio de contribuições, diminui. Essa equação não fecha. A questão não é nova, e as reformas previdenciárias recentes são uma resposta a esse cenário”, explica.
Ajustes necessários
A solução para esse desafio, segundo Flávia, passa por uma série de ajustes que já estão sendo discutidos e implementados. Um dos principais mecanismos é o aumento gradual da idade de aposentadoria. “Esse ajuste é fundamental e já está sendo adotado por vários países. Ele permite uma distribuição mais sustentável dos recursos à medida que as pessoas vivem mais. Além disso, a contribuição proporcional, que varia conforme a expectativa de vida e o nível de renda do trabalhador, é outra estratégia que vem sendo implementada, garantindo que as gerações mais jovens possam contribuir de forma sustentável”, comenta a especialista.
Um ponto importante ressaltado por Flávia é o incentivo à previdência complementar. Muitas empresas têm criado fundos privados de previdência para seus trabalhadores, permitindo que eles possam poupar de forma independente para a aposentadoria, aliviando a pressão sobre o sistema público. Essa medida é crucial para garantir que a previdência pública seja destinada a quem realmente precisa, enquanto aqueles com maior capacidade de poupança possam planejar suas aposentadorias com maior autonomia.
“Outras estratégias incluem reformas nos benefícios, com a limitação de valores mais altos de aposentadorias e pensões, e a adequação de benefícios de longa duração, que podem ser limitados ou reduzidos para garantir a sustentabilidade. Políticas fiscais e previdenciárias também podem ser ajustadas, como a revisão de subsídios e isenções em contribuições previdenciárias. Outro ponto é a integração de políticas de incentivo ao mercado de trabalho, para que mais pessoas, inclusive idosos, possam continuar trabalhando, seja em tempo integral ou parcial. Além disso, a criação de fundos previdenciários independentes das contas públicas pode gerar um retorno de longo prazo e dar uma folga ao poder público”, pontua.
Exemplos internacionais
Diversos países já enfrentaram o mesmo desafio e conseguiram criar sistemas previdenciários mais equilibrados. Flávia aponta alguns exemplos de sucesso. “Na Suécia, foi adotado um sistema de contas em que a contribuição de cada trabalhador é registrada como uma poupança virtual. No Canadá, temos um sistema híbrido, combinando o pilar público com fortes incentivos à poupança privada. E a Alemanha ajusta seus benefícios automaticamente, de acordo com a demografia e o desempenho econômico”, ressalta.
Educação financeira e o futuro da Previdência
A educação financeira é um dos pilares essenciais para mitigar os impactos do envelhecimento da população na previdência social. Ela destaca a importância de conscientizar a população sobre a necessidade de poupar desde cedo para a aposentadoria. “Com a adesão a planos de previdência privada e o planejamento a longo prazo, as pessoas se tornam menos dependentes do sistema público, reduzindo a pressão sobre o Estado e garantindo uma aposentadoria mais segura”, afirma.
Segundo a especialista, a educação financeira deve começar na infância, para que os futuros trabalhadores tenham uma visão mais consciente sobre suas finanças. “É essencial que as próximas gerações entendam a importância de planejar o futuro e economizar para a aposentadoria, garantindo mais estabilidade para si mesmas e para o sistema previdenciário”, infere.
Apesar dos desafios, o sistema previdenciário brasileiro não está condenado ao colapso. As reformas já realizadas e as novas estratégias em discussão mostram que o país está se adaptando à nova realidade demográfica. Além disso, a experiência de outros países oferece modelos que podem ser ajustados à realidade brasileira.
“O mito de que a Previdência Social irá falir com o envelhecimento da população é, portanto, exagerado. Com ajustes adequados, políticas fiscais inteligentes e a promoção da educação financeira, é possível garantir que o sistema continue a atender a população, proporcionando segurança aos aposentados e estabilidade financeira para o país”, finaliza.
Leia também: Mudanças na Lei do Estágio prometem ampliar benefícios para estudantes