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Conheça a história da Maloca, o quilombo urbano de Aracaju

Área situada próximo ao Centro reúne remanescentes dos antigos quilombolas que se estabeleceram no entorno do atual Centro de Criatividade, e foi a segunda do Brasil a ser reconhecida como quilombo urbano

às 19h53
Atualmente, a região da Maloca, entre os bairros Cirurgia e Getúlio Vargas, abriga 267 habitantes, distribuídos em 91 famílias remanescentes dos antigos quilombolas (Reprodução/Cida Nunes/YouTube)
Atualmente, a região da Maloca, entre os bairros Cirurgia e Getúlio Vargas, abriga 267 habitantes, distribuídos em 91 famílias remanescentes dos antigos quilombolas (Reprodução/Cida Nunes/YouTube)
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No centro de Aracaju, em uma extensa área situada junto aos bairros Cirurgia e Getúlio Vargas, existe um grande e importante símbolo de resistência e preservação da cultura e da identidade da população negra de Sergipe: a comunidade da Maloca, que se estende por ruas e vielas do entorno da antiga Caixa D’Água, atual Centro de Criatividade, numa área entre as ruas Marechal Deodoro, Saturnino de Brito, Estudantes e Riachão. Desde 2007, a região é reconhecida pela Fundação Cultural Palmares (FCP), do governo federal, como um quilombo urbano, isto é, um local dentro da cidade que reúne os remanescentes dos antigos quilombolas, descendentes de pessoas negras escravizadas que escapavam de fazendas e engenhos, e dentro do qual preservam suas culturas, tradições e modos de vida. 

Segundo dados oficiais do Censo 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), ela abriga 267 habitantes, distribuídos em 91 famílias. Estima-se que eles tenham chegado à região no início da década de 1900, vindos dos engenhos da região do Vale do Cotinguiba e na condição de ex-escravizados ou filhos de escravizados. À época, a região era conhecida como Morro do Cruzeiro e abrigava esses habitantes em barracos improvisados de palha e madeira. A partir destas estruturas, a região começou a ser chamada de “Maloca”. 

As primeiras melhorias urbanas de infraestrutura, como calçamento de ruas, ligações de energia e implantação de saneamento básico, só começaram a ser implantadas na região por volta da década de 1970, mas se intensificaram na década seguinte, a partir das gestões do então prefeito Jackson Barreto. Na mesma época, os próprios moradores começaram a se organizar em projetos sociais e comunitários, a exemplo da ONG Criliber (Criança e Liberdade), que foi criada em julho de 1982 para, inicialmente, ministrar aulas de música e dança afro para as crianças da comunidade. 

Nos anos que se seguiram, a ONG e os moradores passaram a trabalhar tanto em iniciativas de desenvolvimento local, como construção de casas e cultivo de uma horta comunitária, como em iniciativas de educação, conscientização social e letramento racial. Os projetos foram dando mais visibilidade à Maloca, que também enfrentou conflitos de propriedade com pessoas que alegavam ser donas das terras da região. Uma tentativa de despejo dos moradores chegou a ser feita em 1993, mas foi revertida judicialmente, depois que os moradores mais antigos conseguiram provar que a área não foi invadida. 

Em 2006, os moradores da Maloca se mobilizaram para obter junto ao governo federal, através da FCP, o reconhecimento oficial da comunidade como remanescente de quilombo, o que garantiria a titulação de seus direitos territoriais e garantia de seus direitos sociais, conforme previsto no artigo 68 das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal de 1988. Esse reconhecimento formal veio em janeiro de 2007, fazendo da Maloca a segunda comunidade quilombola do Brasil a ser reconhecida oficialmente dentro de uma cidade. A primeira foi o Quilombo Família Silva, em Porto Alegre (RS), dois anos antes.

Ainda em 2007, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) fez o cadastramento de 69 famílias de moradores da região. Seguiu-se um longo processo de estudo de identificação e delimitação do território a ser titulado, que foi condensado em um relatório técnico e formalizado em 2018, com uma portaria 855/2018 do Incra que demarcou a Maloca em uma área de 0,9328 hectares. A titulação efetiva das terras, que é a concessão definitiva da propriedade delas aos quilombolas, ainda está pendente de aprovação e assinatura por parte do governo federal. A região também é reconhecida pela Prefeitura de Aracaju como Patrimônio Imaterial do Município, através da Lei Municipal 215/2015.

Estudo em filme

A vida da comunidade e seu longo histórico de luta e resistência já foram objetos de um estudo feito em 2018 por alunos e professores do Programa de Mestrado e Doutorado em Saúde e Ambiente (PSA), da Unit. Na ocasião, eles fizeram um trabalho de campo na comunidade, com atividades interdisciplinares sobre o Setembro Amarelo (campanha mundial de prevenção do suicídio) e entrevistaram algumas moradoras sobre o modo de vida, as experiências e os desafios enfrentados no cotidiano. 

A pesquisa resultou no documentário Quilombo Urbano Maloca, que está disponível no YouTube (veja abaixo) e foi destaque em eventos e congressos nacionais, como o 8º Congresso Brasileiro de Ciências Sociais e Humanas, em João Pessoa (PB), e o festival online Cine Caatinga – Experiências Audiovisuais no Sertão, promovido pela Fundação Cultural do Estado da Bahia (Funceb)

com informações da Seasic/SE, da Fiocruz e da Comissão Pró-Índio/SP

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