Enchentes em áreas críticas após chuvas, trânsito travado, iluminação pública ineficiente, dificuldades no monitoramento de espaços públicos e na coleta de dados para políticas públicas. Esses são apenas alguns dos problemas enfrentados por cidades em desenvolvimento, problemas que poderiam ser mitigados ou até evitados com o uso estratégico da tecnologia. É nesse contexto que surge o conceito de cidades inteligentes, um modelo de gestão urbana que propõe a integração entre infraestrutura, tecnologia e dados para melhorar a vida nas cidades.
Cidades inteligentes utilizam recursos digitais para gerenciar serviços públicos de forma mais eficiente. Isso vai desde semáforos com sensores que se adaptam ao fluxo de veículos até sistemas de monitoramento que ajudam a prevenir desastres naturais. E se os desafios são complexos, as soluções também precisam ser criativas, tecnológicas e colaborativas. Foi essa a proposta do Kickoff, projeto pedagógico realizado pelos cursos de Tecnologia da Informação da Universidade Tiradentes (Unit) neste semestre, e que culminou com o Demoday, evento de encerramento em que os estudantes apresentaram suas propostas inovadoras.
A ideia do Kickoff é simples na teoria e rica na prática: propor um desafio real para que os alunos, ainda nos primeiros períodos, desenvolvam soluções tecnológicas viáveis. Neste semestre, o tema “Cidades Inteligentes” foi uma sugestão direta do secretário de desenvolvimento econômico e inovação juntamente com a Prefeitura de Aracaju.
“Em abril, o secretário Dilermando Garcia participou da aula inaugural e apresentou o desafio oficialmente. A partir daí os alunos passaram por quatro semanas intensas de oficinas com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) e mentorias com profissionais do Porto Digital. Tivemos 34 squads apresentando soluções, e hoje, os 10 melhores projetos disputaram o pódio”, pontua o professor dos cursos de TI da Unit, Luiz Gomes.
Tema desafiador, soluções reais
Um dos diferenciais do Kickoff é envolver os calouros dos cursos de TI em um processo que vai muito além da sala de aula. Para o coordenador dos cursos de TI da Unit, professor Ricardo Azevedo Porto, essa vivência inicial com o mercado faz toda a diferença. “Eles já iniciam a graduação com contato direto com problemas reais, profissionais da área, oficinas e mentorias. Isso mostra para os estudantes o que os espera no futuro profissional. É um modelo formativo que conecta teoria e prática desde o começo”, afirmou.
Ricardo também destacou que a crescente demanda por cursos de tecnologia acompanha uma mudança cultural. “Hoje a tecnologia está presente na vida de todos. As pessoas não só querem entender, mas participar dessa transformação. Aqui na Unit, investimos em metodologias inovadoras e contato direto com empresas parceiras, como o Porto Digital, o que garante uma formação mais sólida e conectada com a realidade”, complementa.
A conexão com os desafios reais da cidade também foi ressaltada pelo secretário municipal de Desenvolvimento Econômico e Inovação, Dilermando Garcia. “Encontrar soluções vindas da academia para os problemas do poder público é sensacional. Projetos como os que foram apresentados podem contribuir com mobilidade urbana, saúde, educação e outros setores, gerando impacto direto na vida da população”, declarou.
Segundo ele, a gestão da prefeita Emília Corrêa está focada em inovação e busca implementar ideias com agilidade. “Ela cobra isso das secretarias e costuma dizer: ‘Eu tenho pressa’. E essa urgência em buscar melhorias está presente em todas as áreas da gestão, inclusive na nossa. Por isso, tudo o que pudermos aproveitar desses trabalhos e colocar em prática no poder público será, com certeza, um grande ganho para a administração e, principalmente, para a sociedade, que será diretamente beneficiada com esses serviços”, complementa o secretário.
Mercado e academia lado a lado
A presença do Porto Digital como parceiro estratégico foi fundamental para o sucesso do Kickoff. “Eu vejo que essa parceria posiciona a Unit como uma instituição de vanguarda, uma das líderes no avanço tecnológico local. Hoje já são mais de mil estudantes participando dessa parceria, que coloca os alunos em contato direto com as empresas ao longo de toda a formação. Esse é o principal diferencial da metodologia do Porto Digital: fazer com que o mercado participe da formação dos estudantes. Mas não como mero observador e sim de forma prática”, disse Rodrigo Pereira, gerente de Educação do Porto Digital.
Uma das mentoras do Porto Digital, Bianca Lima, destacou o papel de orientação que desempenhou com os grupos ao longo do semestre. Ela orientou seis grupos, dos quais três chegaram à etapa final. Entre os destaques, ela citou um projeto que propôs a utilização dos dados do sistema Mais Aracaju para melhorar a gestão da frota de ônibus na capital sergipana.
“Orientamos os alunos no desenvolvimento dessas ideias, desde a definição do problema até a construção da solução. Ajudamos a pensar estrategicamente, a realizar pesquisas, a buscar dados e também incentivamos a análise de concorrentes. Eles pensaram em usar os dados que já são coletados nas catracas dos ônibus para identificar horários de pico e linhas mais cheias. A ideia era remanejar a frota nesses momentos críticos, sem necessidade de novos investimentos em coleta de dados. É um uso estratégico de informações que já fazem parte da gestão pública”, ressaltou.
Projetos vencedores do Demoday
Depois da apresentação, os jurados escolheram os três melhores projetos:
1º lugar – Aju Go
Um aplicativo que propõe soluções para mobilidade urbana, como mapeamento de transportes públicos, alertas de trânsito em tempo real e sugestões de rotas alternativas. O app também integra feedback da população e dados da prefeitura.
2º lugar – Olhar Verde
Propõe o uso de sensores e inteligência artificial para monitoramento ambiental, com foco em áreas verdes e zonas de risco de alagamento, permitindo ações preventivas e relatórios automatizados para a gestão pública.
3º lugar – Feira Ágil
Um sistema digital voltado à organização das feiras livres de Aracaju, que inclui cadastramento de feirantes, mapeamento de locais, agenda de funcionamento e até pedidos de delivery para pequenos produtores.
Mais que prêmios, oportunidades
Para a estudante de Ciência da Computação, Nathalie Lima, ficar em 2º lugar com o projeto Olhar Verde é de grande satisfação, ela conta como foi o processo de desenvolvimento do projeto. “Foi pensado especialmente para escolas, mas a nossa solução não se limita a esse ambiente. Por exemplo, no caso da retirada das árvores dos canteiros da avenida Hermes Fontes, nosso sistema poderia ser usado para mapear quais seriam as melhores áreas para replantio e como isso impactaria na redução do calor. Também pode ser aplicado em obras e outras situações urbanas”, conta.
Para Juliana Rocha do curso de Sistema da Informação, representando o grupo vencedor com o projeto AjuGo, o resultado representou mais que uma vitória: foi um impulso para os próximos desafios acadêmicos e profissionais. “Escolhemos esse tema porque é algo que afeta a grande maioria da população de Aracaju e vencer logo no primeiro período é algo que realmente motiva muito mais a gente a participar de outros projetos. Aproveitamos tudo que os nossos professores ensinaram e colocamos em prática para chegar até aqui”, concluiu.
Os vencedores foram contemplados com troféus (ouro, prata e bronze) e o projeto Aju Go também será incubado no Innovation Center. Mas, segundo os organizadores, os demais projetos não serão esquecidos. “O Sebrae já nos pediu acesso a todos os projetos para avaliar ideias que podem virar negócios. A intenção é que essas ideias não fiquem na gaveta”, explicou Luiz Gomes. “Mesmo quem não venceu pode dar continuidade à proposta, seja como TCC, startup ou mesmo no seu futuro emprego”, completa o professor.
Com aproximadamente 340 alunos envolvidos diretamente, o evento mostrou que quando universidade, empresas e poder público trabalham juntos, a inovação sai do papel e pode, de fato, transformar realidades. Com ideias criativas, orientação especializada e apoio institucional, o Demoday segue cumprindo sua missão: transformar boas ideias em soluções reais para a sociedade.
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