A guerra travada entre o Estado de Israel e o grupo palestino Hamas, que controla o território da Faixa de Gaza, ganha contornos ainda mais trágicos a cada dia, principalmente para a população civil que precisou ser retirada das cidades onde acontecem os combates mais violentos. O desdobramento mais recente foi um alerta emitido nesta terça-feira, 30, pela Organização Mundial da Saúde (OMS), que tenta enviar, com urgência, mais de 1 milhão de doses de vacina contra a poliomielite para a região, para fazer uma campanha de vacinação em massa. A medida foi tomada para evitar um surto da doença, depois que o vírus causador foi encontrado em amostras de esgoto coletadas nas cidades e acampamentos do enclave situado entre Israel e Egito.
Este é mais um desdobramento da crise humanitária gerada pelo conflito iniciado após o ataque do dia 7 de outubro de 2023, quando terroristas ligados ao Hamas invadiram cidades da fronteira com Gaza, matando mais de 1.200 israelenses e capturando cerca de 250 reféns. Em resposta, as Forças de Defesa de Israel (IDF) cercaram e atacaram todo o território, na busca de resgatar os reféns e “destruir” o Hamas. Desde então, cidades inteiras foram invadidas e bombardeadas, inclusive hospitais, escolas e mesquitas islâmicas que acabaram destruídas. E ao mesmo tempo, todos os acessos ao território palestino foram fechados, dificultando a chegada da ajuda enviada por outros países, principalmente alimentos e medicamentos. .
“E como se trata de um Estado de Guerra, o resultado é absolutamente inesperado, como em toda guerra. Há palestinos que vivem na região; há israelenses que vivem na região; há brasileiros e pessoas de diversas nacionalidades que vivem ou que se encontram na região. O que faz com que o conflito seja responsável pela deflagração de uma grave crise humanitária, pois se do lado de Israel há um saldo de milhares de mortes por causa dos ataques do Grupo Hamas, em Gaza, um dos territórios palestinos envolvido no conflito, os que não morreram ainda, são condenados à um futuro em que as condições de subsistência inexistem”, diz o professor Dimas Duarte Júnior, professor do Programa de Pós-Graduação em Direitos Humanos da Universidade Tiradentes (Unit).
Ele destaca que esse cerco também destrói toda a infraestrutura necessária para a satisfação das necessidades básicas de subsistência. “Em situações de conflitos armados como o que ocorre atualmente entre Israel e Palestina, há um estado deliberado de violência que sitia pessoas ou populações inteiras ou as obriga a migrar involuntariamente para preservar suas vidas. Há privação do acesso aos produtos de primeira necessidade, como água potável, alimentação, combustíveis, eletricidade, medicamentos e até mesmo de ajuda humanitária. Quem vive da pesca, não tem acesso ao mar e quem vive da agricultura, não tem acesso à terra, pois ou elas foram destruídas ou as pessoas temem por suas próprias vidas se a elas regressarem”, afirma Dimas.
Crimes de guerra
A guerra atual já superou os 40 mil mortos, segundo estimativas recentes divulgadas pelo canal de notícias Al Jazeera, do Qatar. Ativistas e ONGs internacionais que atuam nos territórios da Palestina denunciam que os dois lados estão cometendo diversos crimes de guerra, definidos pelas Convenções de Genebra (de 1949) como todo e qualquer ataque à população civil, uso de armas ou métodos de guerra proibidos, homicídio, tortura, estupro, uso indevido de uniformes de entidades humanitárias e outros delitos usados como tática de guerra. As denúncias acabaram confirmadas pelos relatórios da Comissão de Inquérito da Organização das Nações Unidas (ONU), divulgados em 12 de junho.
Estes relatórios chegaram ao Tribunal Penal Internacional (TPI), em Haia (Países Baixos), cuja promotoria emitiu ordens de prisão contra o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, o ministro da Defesa israelense, Yoav Gallant, e os três líderes políticos e militares do Hamas. Um deles, Ismail Hanyieh, morreu nesta quarta-feira, 31, em Teerã (Irã), após a explosão de uma bomba atribuída a Israel – e contra o qual o Irã prometeu retaliações. Para o professor, a responsabilização por estes crimes de guerra nem sempre ocorre no tempo que sua urgência requer.
“Mas o simples fato de haver procedimentos públicos já instalados perante o TPI já configura um constrangimento, sobretudo para Israel, que é a instituição estatal envolvida no conflito. Sendo a instituição estatal, é a parte que ocupa a zona institucionalizada de poder e, por consequente, a parte que poderá sofrer com isolamento político e até mesmo com a restrição de locomoção de seus agentes políticos pelos espaços internacionais”, explica Dimas, acrescentando que, apesar de países como Rússia, Israel e Estados Unidos não fazerem parte do Tribunal, outros 123 Estados-membros da entidade (incluindo o Brasil) podem cumprir esses mandados.
A luta pela terra
O conflito entre os dois povos não é novo e tem origens que remetem às décadas de 1930 e 1940, quando judeus perseguidos pelo nazismo chegaram em massa à região da Palestina (à época colonizada pelo Reino Unido) e se instalaram nas terras ocupadas pelos palestinos, fundando o Estado de Israel em 1948. A forma como os territórios foram divididos (com a Cisjordânia e a Faixa de Gaza para os palestinos) e as outras guerras travadas pelo estado judeu, em 1967 e 1973, impuseram uma rotina de constantes deslocamentos forçados de região para região, dentro da área disputada.
Dados da Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados Palestinos (UNRWA) mostram que, hoje, existam mais de 14 milhões de refugiados palestinos espalhados pelo mundo, sendo 44% em países árabes, 22% na Cisjordânia, 15% na Faixa de Gaza, 12% em Israel e somente 5% em outros países.
“O impacto dos deslocamentos forçados do povo palestino ainda é uma questão bastante mais impactante para os próprios deslocados, como o é para todo e qualquer povo forçado a deixar seus locais de origem, e para a própria região do conflito, do que propriamente para a comunidade internacional, que constantemente se vê preocupada com o fluxo migratório como uma ameaça aos seus países, aos seus cidadãos, aos seus costumes e às suas culturas. No caso específico dos refugiados palestinos, o fluxo é intra-regional e não transcontinental”, diz o professor Dimas.
com informações da ONU News
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