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Conheça os bacamarteiros, herança africana no folclore sergipano

Grupos formados desde o Século 18 no Vale do Cotinguiba usam antigas armas com pólvora para saudar as festas populares, constituindo uma importante tradição cultural do Estado

às 13h27
O Batalhão de Bacamarteiros do povoado Aguada, em Carmópolis, surgiu em 1780 e é reconhecido como Patrimônio Cultural de Sergipe (Secult-SE/Agência Alese)
O Batalhão de Bacamarteiros do povoado Aguada, em Carmópolis, surgiu em 1780 e é reconhecido como Patrimônio Cultural de Sergipe (Secult-SE/Agência Alese)
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Eles chegam armados nas praças, mas não representam nenhum perigo. O som que os move pode ser de trios pé-de-serra ou mesmo o batucar de tambores, além do fortíssimo estrondo que sai de bacamartes, armas artesanais municiadas com pólvora socada à mão. E esses tiros são disparados como saudação e homenagem ao santo padroeiro, a uma data cívica ou mesmo datas como o Natal, o São João, o São Pedro e o Dia de Reis. Estes são os bacamarteiros, que compõem uma das mais vivas manifestações folclóricas populares presentes em cidades de alguns estados do Nordeste. 

Um dos estados onde a tradição está mais presente é Sergipe, sobretudo nas cidades de Carmópolis, Japaratuba, Capela e General Maynard, todas situadas no Vale do Cotinguiba. Registros históricos apontam que os primeiros grupos surgiram no estado ao final do Século 18, a partir de pessoas negras escravizadas em engenhos de cana-de-açúcar da região. Durante o lazer, elas brincavam de sambas-de-roda, tocando instrumentos de percussão e atirando com as armas fabricadas artesanalmente. 

Essas armas se assemelham ao braquemart, uma espécie de garrucha de cano médio com boca larga e coronha reforçada, que era carregada manualmente e muito usada pelos exércitos da época, incluindo a antiga Armada Imperial (atual Marinha do Brasil). A munição, por sua vez, era uma pólvora fabricada com carvão, cachaça, enxofre e imbaúba, uma árvore nativa da Mata Atlântica. Já os instrumentos musicais que acompanhavam os sambas, como tambores, timbas, chocalhos e reco-recos, também são artesanais, fabricados com madeira da árvore de jenipapo, couro de animais e sementes. 

Por volta de 1780, surgiu o Batalhão de Bacamarteiros do povoado Aguada, em Carmópolis, reconhecido como um dos mais antigos grupos folclóricos do Estado. Desde então, eles promovem e participam de festas e manifestações folclóricas da região. Uma das principais é o “pisa-pólvora”, realizado em louvor aos santos do ciclo junino (Santo Antônio, São João e São Pedro), e à padroeira de Carmópolis, Nossa Senhora do carmo, celebrada em julho. Nesse ritual, é preparada a pólvora usada como munição para os bacamartes. Em todas as participações, eles fazem cortejos, percorrendo as casas dos moradores e dando as salvas de tiros, acompanhadas com batucada, cantos tradicionais e muita alegria. 

Em 2016, o Batalhão de Bacamarteiros da Aguada foi reconhecido como Patrimônio Cultural Imaterial de Sergipe, através de um tombamento aprovado pelo Conselho Estadual de Cultura. De acordo com o decreto, o grupo é uma prova viva da herança africana deixada pelos negros na região do Vale da Cotinguiba. Atualmente, ele tem cerca de 80 componentes entre homens, mulheres e crianças, que foram herdando a tradição ao longo das gerações. 

O grupo também deixou sua marca em festivais e encontros culturais de todo o Brasil, firmando os bacamarteiros como parte da identidade cultural de Carmópolis e de Sergipe. Um exemplo disso aparece no hino da Sociedade Esportiva River Plate, clube de futebol sediado em Carmópolis e atualmente extinto, que chegou a ser bicampeão sergipano em 2010 e 2011, além de disputar jogos da Copa do Brasil contra Botafogo (RJ) e Grêmio (RS). O hino do time fazia referência direta aos bacamarteiros da cidade. “River brasileiro, meu bacamarteiro, / é sergipano e vai vencer no mundo inteiro. / River Plate, River Plate, / vamos lá, meu batalhão!”, dizia um dos versos do hino, cuja gravação terminava com o marcante batuque dos bacamarteiros. 

com informações do iPatrimônio.org

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