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Como o letramento racial ajuda a desvendar e combater o racismo

Práticas pedagógicas buscam explicar e orientar sobre conceitos que embasam a discriminação e o preconceito, com o objetivo de reeducar comportamentos e atitudes

às 15h05
O professor Eduardo Santiago Pereira, do curso de Direito da Universidade Tiradentes (Divulgação)
O professor Eduardo Santiago Pereira, do curso de Direito da Universidade Tiradentes (Divulgação)
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“Como eu já disse, racismo é burrice, e a ignorância é um ponto final. Faça uma lavagem cerebral!” A convocação vem na música Lavagem cerebral, gravada em 1992 pelo rapper Gabriel O Pensador. Os versos contundentes dissecam o racismo em suas origens, presença e consequências para a sociedade, além de oferecer um caminho para, como diz a própria música, “agir de forma mais consciente, eliminando da mente todo o preconceito, e não agindo com a burrice estampada no peito”. Essa “limpeza” da mente ganhou nos tempos atuais um novo significado e conceito: o letramento racial

No dicionário da Academia Brasileira de Letras (ABL), esse processo é definido como um “conjunto de práticas pedagógicas que têm por objetivo conscientizar o indivíduo da estrutura e do funcionamento do racismo na sociedade e torná-lo apto a reconhecer, criticar e combater atitudes racistas em seu cotidiano”. Sua autoria é atribuída à socióloga norte-americana France Winddance Twine, que desenvolveu esse conceito em livros e estudos sobre as relações entre famílias negras e brancas no Reino Unido e nos Estados Unidos. A partir de 2014, essa tese começou a ser adotada e mais propagada por ativistas e organizações de defesa da população negra, inclusive no Brasil. 

O letramento, cujo termo é mais associado ao uso e domínio da linguagem, consiste em explicações e orientações sobre conceitos de raça, classes sociais, preconceito, discriminação e desigualdade, entre outros. Nesse processo, a pessoa aprende ainda sobre como o racismo se instituiu no país e na sociedade, concedendo muitos privilégios e hegemonia política e socioeconômica para as pessoas brancas, em detrimento das pessoas negras e indígenas. 

Para o professor Eduardo Santiago Pereira, do curso de Direito da Universidade Tiradentes (Unit), esse processo busca revelar uma percepção do racismo como mecanismo voltado à manutenção da hegemonia política e econômica das pessoas brancas, também chamada de “branquitude”. 

“Assim sendo, falar em Racial Literacy é também discorrer acerca de algumas regras imperativas para se fazer um enfrentamento das questões raciais em nossa sociedade. Portanto, ter noção da importância do reconhecimento da branquitude, da atualidade do problema racial, da noção de que as relações sociais são racializadas e aprendidas, como também da importância de se buscar entender como o vernáculo interage e reafirma intensamente um padrão voltado para cercear e estigmatizar um grupo em detrimento do outro, obriga-nos a estar atentos e vigilantes para situações e práticas racistas engendradas em nosso dia-a-dia”, explicou Eduardo. 

Ainda de acordo com ele, o letramento racial reúne perspectivas que representam ações que cada pessoa, em seu universo particular, tem a capacidade de interceder e influenciar no sentido de rever conceitos e reeducar comportamentos e atitudes. Aqui, o professor lista algumas delas.

– Racismo estrutural – Seu conceito ficou mais conhecido a partir do livro escrito em 2019 pelo jurista e professor Sílvio Almeida, atual ministro dos Direitos Humanos e Cidadania. Trata-se da forma como se organizam as hierarquias sociais e relações de poder, conferindo um acesso mais privilegiado das pessoas brancas às melhores condições econômicas, sociais, culturais e de poder. “Assim, falar em racismo estrutural significa discutir o modelo de sociedade construída a partir da matriz capitalista de acumulação de riqueza e subordinação social entre os grupos”, resume Santiago.

– Racismo institucional – Essa noção é mais presente a partir de instituições e organismos, públicos ou privados. “Em função da matriz estabelecida, ela cria códigos e regras que, por si sós, auxiliam na manutenção do status e dos espaços de poder nas mãos da parcela hegemônica da sociedade, refletindo-se, inclusive, na forma como essas instituições operam extramuros”, detalha. 

– Racismo recreativo – É associado ao uso de termos e expressões racistas com a intenção aparente de brincar, fazer galhofas ou piadas, que, todavia, têm o condão de ajudar no processo de desmerecimento e perpetuação da visão desqualificada de suas vítimas. É o que pode aparecer também em músicas, desenhos e no chamado “blackface”, prática teatral na qual atores brancos pintam o rosto e a pele com tinta preta para interpretar personagens negros. 

– Racismo religioso e cultural – É uma percepção que se sustenta na busca constante de uma associação negativa dos símbolos, objetos e história das religiões de matriz africana ou de quaisquer outros tipos de manifestações culturais que tenham origem na África Negra. Na religião, é o caso dos ataques físicos e verbais contra templos e fiéis da umbanda e do candomblé. E na cultura, aparece na desqualificação e até na criminalização de gêneros musicais como samba, rap, reggae e funk

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