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Como a saúde bucal pode afetar a saúde mental, e vice-versa

Pesquisa de universidade japonesa aponta que pessoas afetadas com problemas na boca também podem ser afetados por questões da vida social e da situação psicológica

às 17h48
A pesquisa apontou que os idosos são mais atingidos por problemas de saúde bucal, que afetam a auto-estima e a sociabilidade (Mirdental Network/Pexels)
A pesquisa apontou que os idosos são mais atingidos por problemas de saúde bucal, que afetam a auto-estima e a sociabilidade (Mirdental Network/Pexels)
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Os cuidados com a saúde mental também passam pela saúde da boca. Essa constatação veio de um estudo recente publicado pelo portal científico Public Library of Science (PLoS) e produzido por pesquisadores da Universidade de Okayama, no Japão, que acompanharam 218 pacientes idosos atendidos no hospital da instituição. Através de exames médicos e aplicação de questionários sobre saúde geral e qualidade de vida, eles constataram que parte dos idosos com problemas de saúde bucal também eram afetados por questões ligadas à vida social e à saúde mental, como a solidão, a reclusão e a falta de sociabilidade. 

Diz ainda que um ponto de conexão entre esses aspectos está na má alimentação e em vícios como o alcoolismo e o tabagismo, que também impactam negativamente o bem-estar. “Os resultados do presente estudo sugerem associações entre condição bucal e estado nutricional e entre estado nutricional e bem-estar subjetivo entre idosos atendidos em clínica odontológica de hospital universitário, influenciadas por características ambientais. A condição bucal pode influenciar o bem-estar subjetivo através do estado nutricional”, concluiu a pesquisa japonesa. 

A professora Guadalupe Sales Ferreira, coordenadora do curso de Odontologia da Universidade Tiradentes (Unit), também considera a correlação entre saúde bucal e saúde mental. “As pessoas que não têm uma saúde bucal adequada passam por problemas de autoestima, de pouca socialização, de baixa oportunidade de emprego, e tudo isso mexe muito com a saúde mental das pessoas”, diz ela, pontuando que isso passa por várias questões relacionadas à saúde bucal: desde as estéticas, relacionadas ao formato e à coloração dos dentes, até a condições de doenças como cárie, má mastigação, lesões na gengiva (periodontia) e a perda de dentes (edentulismo). 

De acordo com Guadalupe, um dos maiores problemas de saúde bucal está no comprometimento sistêmico de funções como mastigação e deglutição, que representam o início do processo de digestão de alimentos. “Se a pessoa não consegue fazer uma mastigação adequada, isso pode gerar problemas no aparelho digestivo e comprometer uma parte desse processo de digestão. Então, a questão também é nutricional, porque acaba que algumas pessoas evitam alguns alimentos, principalmente pelo problema da falta do dente”, atesta ela, citando um dado apurado em 2018 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE): cerca de 16 milhões de brasileiros vivem desdentados. 

Outro mal que impacta a autoestima, a socialização e até a empregabilidade de uma pessoa com a saúde bucal afetada está na halitose, também chamada mau hálito ou “bafo”. Segundo a professora, esse problema pode estar relacionado a algumas causas corporais, como problemas na garganta ou no sistema digestivo, o que muitas vezes exige um trabalho multiprofissional. “Mas já tem estudos que revelam que 80% dos problemas de halitose estão relacionados à cavidade bucal e não a problemas sistêmicos. Por isso que os problemas bucais são a principal causa da halitose, e quem os tem precisa procurar um cirurgião dentista, orienta.

Existe ainda um caminho inverso, isto é, quando os problemas de saúde mental acabam resultando em transtornos e situações que pioram a saúde da boca e dos dentes. Um exemplo está no estresse e na ansiedade. “Nós temos um problema chamado bruxismo ou apertamento dentário, que pode causar desgaste das unidades dentárias, a depender da severidade do bruxismo. E ele é um sinal de ansiedade: a pessoa aperta e range os dentes geralmente à noite”, explica Guadalupe.

A professora cita a também a disfunção temporomandibular [DTM], que desgasta a articulação entre o crânio e a mandíbula, responsável pela função de abrir e fechar a boca. E ainda a bulimia, na qual as pessoas vomitam depois das refeições. “Isso traz o ácido do estômago para a boca e isso pode causar uma lesão cavitária nos dentes a partir desse ácido das pessoas que têm esse transtorno alimentar”, completa ela.

Público mais afetado

A pesquisa da Universidade de Okayama focou-se mais nos idosos, pelo fato de eles serem praticamente 30% da população japonesa e concluindo que eles são afetados sobretudo pela perda de dentes, pela baixa socialização e baixa autoestima. No entanto, a professora Guadalupe afirma que as questões da saúde mental em relação à saúde bucal dependem muito de como cada pessoa se sente daquela forma. E na realidade brasileira do momento, esses problemas bucais, principalmente a cárie e a perda de dentes, afetam mais as comunidades em situações de pobreza e miséria. 

“Infelizmente, são os grupos que têm uma condição socioeconômica pior, que têm menos acesso à informação, à prevenção, aos serviços de saúde. Os adultos e idosos sofrem mais com a perda dentária, e isso influencia diretamente na saúde mental das pessoas, com certeza”, diz a odontóloga. 

Saúde mais ampla

A retomada e a manutenção dos cuidados com a saúde bucal vão muito além das idas ao dentista ou da higienização constante da boca. Para Guadalupe Sales, o conceito de saúde não se resume mais à ausência de doença, mas está ampliado ao conceito de bem estar biopsicossocial. “Tudo isso vem através de políticas públicas que priorizam a saúde nesse contexto mais ampliado. Bem estar, acesso à educação, à informação, à prevenção, a serviço de saúde e renda, porque a gente sabe que doença está diretamente ligada à condição socioeconômica das pessoas. É por aí que a gente consegue, porque só considerando saúde como ausência de doença, a gente não trabalha todas essas questões necessárias e não adianta só você ter a parte curativa do problema”, conclui a professora.

* Matéria atualizada às 15h36, para correção de informações

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