Uma das consequências mais presentes na saúde de pessoas com obesidade aparece justamente nos males e doenças do fígado, que costumeiramente são associadas ao consumo de bebidas alcoólicas. É a presença excessiva de gordura no fígado, também chamada de esteatose hepática, que a longo prazo pode causar uma série de complicações graves, incluindo a cirrose. A condição vem ganhando um aumento significativo de casos em todo o mundo, à medida que o número de pessoas muito acima do peso também cresce.
É o que aparece em uma pesquisa recente, elaborada em 2023 por pesquisadores da Universidade da Califórnia San Diego (UCSD), nos Estados Unidos. Ela mostrou que a prevalência de jovens de 15 a 19 anos com doenças hepáticas subiu de 3,73% em 1990 para 4,71% em 2019, o que representa um aumento de 26,27%. Os países da Oceania tiveram a maior prevalência destes casos em adolescentes, com 6,54%, mas o maior crescimento de casos neste espaço de 29 anos, com 39,25%, aconteceu na América do Sul. E a grande maioria destes casos está ligada ao aumento dos Índices de Massa Corpórea (IMC), os quais configuram situações de sobrepeso e obesidade.
O médico Leonardo Figueiredo Inácio de Souza, endocrinologista e professor do curso de Medicina da Universidade Tiradentes (Unit), explica que a esteatose hepática se configura quando o acúmulo de gordura no fígado passa de uma determinada quantidade. “Ela se acumula principalmente quando o corpo tem mais gordura circulando do que consegue usar ou eliminar. Isso pode acontecer por uma alimentação rica em açúcares e gorduras, sedentarismo, ganho de peso, diabetes mal controlado, entre outros fatores. O fígado acaba ‘guardando’ esse excesso na forma de gordura. Não é uma doença isolada, mas um sinal de que o fígado está sobrecarregado”, detalha.
Em alguns casos, a esteatose pode evoluir e causar complicações como inflamação ou mesmo danos permanentes no fígado. “No curto prazo, muita gente nem percebe que tem gordura no fígado, é silencioso. Mas, com o tempo, ela pode causar inflamação, o que chamamos de esteato-hepatite. Em alguns casos, isso pode evoluir para fibrose, cirrose e até câncer de fígado. É por isso que ela merece atenção, alerta Leonardo.
O professor classifica a obesidade como um dos principais fatores de risco para a esteatose hepática. Isso acontece especialmente por causa da gordura abdominal, que se acumula em volta dos órgãos e está muito ligada à gordura no fígado. Ou seja: quanto maior o acúmulo de gordura corporal, maior a chance de sobrecarga no fígado.
Como tratar
Muitas pessoas costumam recorrer aos chamados “remédios para o fígado”, baseados em substâncias como ácido ursodesoxicólico, silimarina, colina e metionina. No entanto, de acordo com o professor Leonardo, esses medicamentos ajudam a aliviar sintomas como a má digestão. “Na prática, não têm comprovação científica de que revertam a esteatose hepática. Muitas vezes, dão a impressão de “limpar o fígado”, mas não resolvem o problema da gordura no fígado”, esclarece.
Neste sentido, a medida considerada como a mais eficaz para reduzir a gordura no fígado é a perda de peso. Figueiredo ressalta que a diminuição entre 5 e 10% do peso corporal já pode fazer uma grande diferença no paciente, e que, em muitos casos, a esteatose pode até desaparecer com mudanças no estilo de vida, com mudanças na alimentação e adoção de exercícios físicos. Outros métodos de perda de peso, como cirurgia bariátrica ou medicamentos como a semaglutida (Ozempic) e a tirzepatida (Mounjaro) também podem ser cogitados.
“O importante é perder peso e mantê-lo. Os três métodos podem ser eficazes. A cirurgia bariátrica, por exemplo, tem efeito rápido e profundo. Já os medicamentos mais modernos têm mostrado resultados muito positivos, tanto na perda de peso quanto na melhora da esteatose. E claro, a mudança de hábitos alimentares e atividade física são sempre a base do tratamento”, destaca o endocrinologista, citando a adoção de alimentos mais favoráveis ao fígado, como frutas, verduras, legumes, grãos integrais, azeite de oliva, castanhas e outros alimentos ricos em fibras. “Evitar alimentos ultraprocessados, açúcar em excesso, refrigerantes, bebidas alcoólicas e frituras é fundamental”, acrescenta.
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