O comportamento da inflação continua sendo um ponto de atenção e tensão para as autoridades monetárias, para o mercado e para a população, que reclama cada vez mais da alta dos preços dos alimentos e serviços. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que é o indicador oficial da inflação, fechou o mês de abril em 0,43%, conforme os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Este resultado foi menor que os 0,56% apontados em março e os 1,31% de fevereiro, o que indica desaceleração. No entanto, se comparados os períodos de 12 meses consecutivos, o IPCA somou 5,53%, sendo o maior desde fevereiro de 2023 (5,6%) e acima da meta de inflação de 3% estipulada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), mesmo com a tolerância de 1,5 ponto percentual para mais ou para menos.
A principal avaliação é de que essa alta foi puxada principalmente pelo aumento dos preços dos produtos do grupo Alimentação e Bebidas, que responde por quase 20% dos produtos e serviços pesquisados pelo IPCA. O grupo teve alta de 0,82% durante o período. Outros dois grupos, o de Saúde e Cuidados Pessoais e o de Vestuário, tiveram índices maiores que 1%, mas tiveram menos repercussão por terem peso menor no cálculo final do índice.
“A alta dos alimentos deve-se a fatores como condições climáticas desfavoráveis, problemas na oferta, custos de produção elevados e flutuações no mercado internacional. Enquanto produtos como batata-inglesa, tomate e café moído sofreram aumentos consideráveis, itens como arroz e frutas apresentaram queda, demonstrando a complexidade e variedade de influências nesse setor”, explica o economista e professor Rodrigo Rocha, dos cursos de Administração, Ciências Contábeis e pós-graduação Lato Sensu da Universidade Tiradentes (Unit).
Além das condições climáticas, outros fatores geopolíticos ajudaram a pressionar indiretamente a alta dos preços medidos pelo IPCA, como a disputa tarifária entre EUA e outros países, o aumento da dívida pública e o descontrole nos gastos governamentais. “A imposição de tarifas e barreiras comerciais tende a encarecer insumos importados e gerar volatilidade nas commodities, afetando o custo dos alimentos. Contudo, os dados de abril não apontam este como o principal motor da inflação, mas sim como um potencial agravante. O endividamento e a percepção de risco fiscal levam à desvalorização do real, elevando o dólar e, por consequência, o preço de produtos importados e insumos. Essa instabilidade fiscal também mina a confiança dos agentes econômicos, pressionando os preços”, detalha Rodrigo.
Na visão do professor, esse cenário de pressões sobre alimentos e serviços, bem como as incertezas fiscais, a volatilidade no mercado internacional e as possíveis medidas econômicas que ainda podem ser adotadas pelo presidente norte-americano Donald Trump, cria a expectativa de que a inflação permaneça alta pelo resto do ano. “Embora o segundo semestre possa trazer alguma desaceleração, isso dependerá fortemente das medidas para controle dos gastos públicos e da evolução do cenário internacional”, avalia.
Juros altos
A alta da inflação é a justificativa alegada pelo Banco Central para o aumento dos juros básicos da economia. No último dia 7, o Comitê de Política Monetária do BC (Copom) aumentou a taxa Selic pela sexta vez consecutiva, deixando-a em 14,75% ao ano. Para a próxima reunião, o Copom não deu nenhum indicativo de alta ou de redução dos juros: disse apenas, em um comunicado oficial, que “o cenário de elevada incerteza, aliado ao estágio avançado do ciclo de ajuste e seus impactos acumulados ainda por serem observados, demanda cautela adicional na atuação da política monetária e flexibilidade para incorporar os dados que impactem a dinâmica de inflação”.
Rodrigo Rocha explica que a política monetária de restrição adotada pelo BC tem o objetivo de conter a inflação mas prejudica duplamente o investimento, pois desestimula o consumo e dificulta o acesso ao crédito, tornando-o mais caro. “Além dos problemas já apresentados, isso ainda aumenta o custo da dívida pública. Sem um ajuste fiscal que consiga equilibrar todas estas variáveis, essa medida pode ser insuficiente e agravar o cenário econômico”, diz ele, acrescentando que até mesmo os indicadores econômicos positivos alcançados pelo governo em 2024, como o crescimento de 3,4% no Produto Interno Bruto (PIB) e a redução do índice de desemprego para 6,4%, “podem pressionar a inflação se a demanda superar a oferta”.
Os dados corroboram com uma percepção popular bastante expressada no cotidiano das ruas: a de que “está tudo mais caro e o dinheiro não está dando pra nada”. Segundo o professor, o aumento dos preços de itens essenciais reduziu a renda disponível e o poder de compra das famílias, especialmente das classes D e E, nas quais 80% do orçamento é destinado a gastos básicos, o que intensifica o sentimento de perda de qualidade de vida. “As ações do governo, portanto, são essenciais para uma economia sustentável, evitando um ciclo vicioso de baixo crescimento e inflação elevada”, finaliza Rocha.
com informações da Agência Brasil
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