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Campanhas virtuais de boicote impõem novas regras a marcas

Movimentos surgidos nas redes sociais pressionam marcas e empresas a retirarem anúncios de sites e veículos de comunicação acusados de escândalos ou discursos de ódio

às 20h45
O movimento Sleeping Giants, surgido nos Estados Unidos, pressiona empresas a fazerem boicote a sites, blogs e veículos acusados de discursos de ódio (Divulgação)
O movimento Sleeping Giants, surgido nos Estados Unidos, pressiona empresas a fazerem boicote a sites, blogs e veículos acusados de discursos de ódio (Divulgação)
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O “cancelamento” praticado diariamente nas redes sociais ganhou nos últimos anos uma nova vertente. Ele passa a ditar expressamente quem deve ou não ser patrocinado ou associado a grandes marcas. São as chamadas campanhas de boicote ou desmonetização, voltadas principalmente contra blogs, sites e veículos de comunicação acusados de promover discursos de ódio ou desrespeito contra minorias. Um exemplo mais recente foi o do movimento “Sleeping Giants”, que surgiu em 2016 nos Estados Unidos para pressionar anunciantes a cancelar anúncios em sites de extrema-direita e até no canal de notícias Fox News, abertamente conservador. 

No Brasil, o movimento surgiu em 2018, a partir de um casal de estudantes do interior do Paraná, que formou o “Sleeping Giants Brasil” e, a princípio de forma anônima, fez a mesma estratégia contra anunciantes que aparecem em sites e perfis ligados ao filósofo direitista Olavo de Carvalho. Em 2019, o alvo foi o economista e comentarista político Rodrigo Constantino, acusado de minimizar o caso de um estupro cometido contra uma jovem em Florianópolis (SC). Após pressão do casal e de apoiadores, Constantino foi demitido do site R7 e das rádios Jovem Pan (SP) e Guaíba (RS), onde fazia comentários. Depois, o alvo foi o jornal Gazeta do Povo, de Curitiba (PR), que manteve a publicação das colunas do comentarista, evocando o princípio da liberdade de expressão, e ainda fez uma campanha de contra-ataque ao Sleeping Giants. 

O tema voltou a ser debatido nesta semana após a polêmica com o apresentador Sikêra Júnior, que em seu programa policial “Alerta Nacional”, da TV A Crítica, de Manaus (AM), retransmitido nacionalmente pela RedeTV!, fez uma série de ofensas e comentários homofóbicos para criticar um comercial de uma rede de lanchonetes sobre a forma como as crianças vêem a diversidade sexual. Sikêra chegou a acusar pessoas homossexuais de pedofilia, chamando-as de “raça desgraçada”. Em resposta, movimentos de defesa da causa LGBT se juntaram ao Sleeping Giants e fizeram seis empresas cancelarem seus patrocínios no programa, além de provocar um processo do Ministério Público Federal (MPF) contra as emissoras. Dois dias depois, o apresentador pediu desculpas e reconheceu que “se excedeu”. 

Para a professora Juliana Almeida, do curso de Jornalismo da Universidade Tiradentes (Unit Sergipe), este novo ativismo é um reflexo da cultura digital e da descentralização dos discursos, que deu mais espaço aos consumidores para defender ideias e marcar posições pelas redes sociais

“Hoje, as marcas se posicionam também a partir daquilo que os consumidores esperam, até porque os consumidores têm mais voz. Com a cultura digital e essa descentralização da informação, todo mundo tem o seu lugar de fala. Nenhuma marca quer ter hoje o seu nome e a sua imagem associada a temas que possam trazer danos. Então, quando algum artista ou pessoa pública se envolve em escândalos sexuais, violência doméstica, LGBTfobia e tantas outras questões que são hoje muito combatidas pela sociedade, as marcas acabam também sendo associadas a essas pessoas. E há uma pressão popular, através da cultura do cancelamento, para que essas marcas deixem de apoiar”, explica. 

Efeitos

O principal efeito das campanhas virtuais de boicote é a rapidez nas mudanças de posicionamento das empresas, diante dos episódios de crise de imagem. “Antes, isso até acontecia, mas demorava muito para que as marcas se reposicionassem. Hoje, como as pessoas têm mais lugares de fala, as marcas não demoram muito e agem rápido, porque o dano, realmente, pode ser grande. Isso mostra como essa tecnologia mediada, horizontalizada, onde todos falam pra todos, vem mudando também o comportamento das próprias marcas ao se posicionar em assuntos polêmicos e importantes”, destaca Juliana, citando como exemplo a realização da Copa América no Brasil. A vinda do evento foi criticada devido ao alto número de casos de coronavírus no país, o que não recomendava sua realização e fez com que muitos patrocinadores desistissem de apoiá-lo. 

Outros aspectos destacados pela professora Juliana são a cultura do compartilhamento, na qual as pessoas repassam conteúdos para muitas outras, e a obrigatoriedade de as empresas criarem e manterem mais canais de comunicação e interação com seus clientes e consumidores, através de perfis em redes sociais e outros espaços. 

“Isso faz parte, inclusive, de uma receita de sucesso: quanto mais próximo do seu consumidor, mais você tem mais chance de ter sucesso. Essa aproximação antigamente acontecia muito pelas celebridades. Hoje, há esses canais nos quais as empresas ficam mais próximas dos seus consumidores”, afirma Juliana, ressaltando ainda que as marcas andam muito mais cautelosas ao se vincularem a determinado artista ou pessoa pública, justamente pelos riscos de cancelamento. “Isso pra imagem da empresa é muito ruim, porque demora muito pra recuperar uma imagem que pode ser perdida ou danificada em pouco tempo”, resumiu. 

Asscom | Grupo Tiradentes

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