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Licuri Sustentável impulsiona protagonismo feminino na ciência em Sergipe

Projeto transforma óleo de licuri em cosméticos ecológicos, levando inovação, inclusão e formação científica a estudantes do semiárido sergipano por meio do programa Meninas na Ciência.

às 18h19
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O universo da ciência, por muito tempo dominado por figuras masculinas, hoje se abre para a pluralidade e o talento feminino, graças a iniciativas como o programa Meninas na Ciência. Atuante em diversas frentes pelo Brasil, o projeto busca desmistificar a imagem de que a pesquisa científica é um campo exclusivamente masculino, incentivando a participação de meninas e jovens em áreas tradicionalmente associadas às Ciências Exatas e Engenharias.

Desde 2018, a Universidade Tiradentes (Unit) participa ativamente do programa com o apoio de agências como o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e a Fundação de Apoio à Pesquisa e à Inovação Tecnológica do Estado de Sergipe (Fapitec/SE) por meio de inúmeros projetos coordenados por suas pesquisadoras. Um dos exemplos mais bem-sucedidos dessa iniciativa é o projeto “Licuri Sustentável”, coordenado pela professora e pesquisadora do Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Processos (PEP) da Unit, Cleide Mara Faria Soares.

Essa parceria, que também envolve o Instituto de Tecnologia e Pesquisa (ITP) e a Universidade Federal de Sergipe (UFS), tem como meta principal reduzir a desigualdade de gênero no campo científico, abrindo portas e construindo um futuro mais inclusivo para as próximas gerações de pesquisadoras. Com uma trajetória dedicada à pesquisa e ao ensino, as pesquisadoras da Unit têm sido fundamentais na integração entre o ensino superior e a educação básica, inserindo alunas do ensino médio em pesquisas dos programas de Pós-Graduação da Unit.

Ciência e sustentabilidade

Aprovado em 2024 pelo Edital FAPITEC/SE/SPM nº 09/2024, o projeto “Licuri Sustentável: Promovendo Talentos Femininos na Ciência e Tecnologia através da Biotransformação de Óleo Natural para a Produção de Produtos de Higiene Ecológicos” tem expandido sua atuação para municípios do semiárido sergipano como Ribeirópolis, São Miguel do Aleixo e Moita Bonita. “A iniciativa leva ciência e tecnologia para mais perto das comunidades, promovendo inclusão, equidade e a formação de futuras cientistas em Sergipe”, explica Cleide Mara.

O projeto se destaca ao unir sustentabilidade ambiental, inovação tecnológica e formação científica. A proposta envolve diretamente cerca de 56 meninas do ensino médio, além de professores da rede pública, que atuam como orientadores ou recebem bolsas de apoio técnico. Este projeto também conta com a participação das pesquisadoras Juliana Cordeiro Cardoso, Patrícia Severino, Adriana de Jesus Santos, Adriana Karla Lima e do pesquisador Heriberto Alves dos Anjos.

“As estudantes participam de todas as etapas, desde a extração do óleo até a formulação de produtos ecológicos com potencial cosmético. A proposta é desenvolver cosméticos sustentáveis e, ao mesmo tempo, promover a formação científica de meninas por meio de oficinas e divulgação científica”, explica Cleide Mara. O projeto também está diretamente conectado às pesquisas da coordenadora, focadas em matérias-primas vegetais e biocatálise enzimática.

Entre os temas abordados nas oficinas estão a extração do óleo de licuri, biotransformações enzimáticas, formulação de cosméticos ecológicos, sustentabilidade e carreiras científicas. Um sistema de avaliação contínua acompanha o aprendizado e o engajamento das participantes, por meio de formulários aplicados em três etapas: visita às escolas, visita à Unit e oficina prática.

“O envolvimento das meninas com temas abordados na pós-graduação é direto e significativo. Elas participam das oficinas e interagem com mestrandas e doutorandas do Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Processos, visualizando na prática a construção de uma trajetória científica. Os conteúdos trabalhados, como extração de óleo de licuri e formulação de cosméticos, são os mesmos explorados em projetos de pesquisa do PEP, o que reforça a integração entre diferentes níveis de formação e incentiva o protagonismo feminino na ciência e tecnologia”, pontua a Cleide.

Representatividade e conexão com as escolas

As atividades ocorrem de forma quinzenal ou mensal, intercalando oficinas nas escolas com vivências nos laboratórios da Universidade Tiradentes e do Instituto de Tecnologia e Pesquisa. As instituições de ensino envolvidas são o Colégio Municipal Josué Passos (Ribeirópolis), o Colégio Estadual Djenal Tavares de Queiroz (Moita Bonita) e o Centro de Excelência Miguel das Graças (São Miguel do Aleixo). A presença da Profa. Dra. Adriana de Jesus Santos, ex-aluna do Colégio Josué Passos, e do Prof. Heriberto dos Anjos, do Colégio Djenal Tavares, fortalece os vínculos com as comunidades locais.

Para Adriana, estar de volta na escola é um ato de resistência e representatividade. “Poder olhar nos olhos das meninas e dizer: ‘Eu estive exatamente onde vocês estão, na mesma sala, e hoje sou pesquisadora do Programa de Pós-graduação conceito 6 da Unit, quando era estudante de graduação da instituição eu sempre falava para um dos meus professores que um dia eu ia ser professora e pesquisadora na Instituição’. Isso é mais do que inspirador, é um ato de resistência e representatividade. Quero que elas se vejam em mim e entendam que é possível, sim, conquistar seu espaço na ciência, mesmo vindo de realidades desafiadoras”, afirma.

Ela destaca a importância de sua participação no projeto como ex-aluna de uma das escolas envolvidas. “Voltar à escola onde estudei, agora como pesquisadora, é uma experiência profundamente simbólica e emocionante. Venho de uma família humilde, onde a maioria dos meus familiares é analfabeta. Fui a primeira mulher da minha família a concluir o ensino superior. Algo que, por muito tempo, parecia um sonho distante. Vindo de uma realidade marcada por limitações sociais e econômicas, pude vivenciar na pele o quanto o acesso à educação científica ainda é desigual, especialmente para meninas. Por isso, atuar como pesquisadora hoje, levando conhecimento para esses territórios, é também um ato de transformação social”, compartilha.

Protagonismo feminino e inclusão social

Para Mariana Costa Barbosa, aluna do Colégio Estadual Djenal Tavares de Queiroz, de Moita Bonita, o projeto “Meninas na Ciência” foi um convite à descoberta de habilidades até então pouco exploradas por ela mesma. Indicada por seu professor de química, ela viu na iniciativa uma oportunidade de aprofundar seu interesse pela área científica. “Decidi participar por já ter interesse na área científica e achei que seria uma ótima oportunidade para aprender mais sobre a área”, revela Mariana, que integra o projeto desde outubro de 2024.

Dentre as experiências, a formulação de cosméticos à base de óleo de licuri e a visita aos laboratórios da Unit foram as que mais a cativaram. A vivência prática, em especial, foi um divisor de águas. “Uma das experiências mais marcantes para mim foi a parte prática em que fizemos as formulações. Através dela, pude conhecer melhor como é esse processo e assim consegui enxergar com mais clareza as portas que a ciência pode abrir para mim no futuro”, destaca.

O Meninas na Ciência não apenas confirmou a paixão de Mariana pela ciência, mas também a impulsionou a considerar uma carreira na área da saúde. Ela ressalta a importância de um projeto que incentiva meninas a trilharem esses caminhos. “Me sinto representada e impulsionada a seguir um caminho que muitas vezes ainda é visto como diferente para meninas. E isso faz muita diferença, o projeto me mostrou que a ciência é uma ótima escolha e é lugar também para nós”. A confiança em seu potencial também foi fortalecida. “Hoje eu consigo ver com mais confiança as possibilidades para o meu futuro profissional. O projeto me ajudou a acreditar mais no meu potencial e no que posso alcançar”, completa.

Aliado na luta pela equidade

O projeto transcende a questão de gênero, acolhendo e valorizando a contribuição de todos que acreditam na equidade. João Pedro Bezerra Gonzaga, graduando em Farmácia na Unit e bolsista FAPITEC, é um exemplo dessa colaboração essencial. Desde 2024, ele atua como aluno de iniciação científica, desenvolvendo procedimentos operacionais padrão e formulando kits de higiene ecológicos com óleo de licuri, além de ministrar oficinas e palestras para as estudantes.

Apesar do projeto ser prioritariamente voltado para meninas, João Pedro encontrou uma motivação profunda para participar. “Infelizmente nos dias de hoje o meio científico ainda é muito preenchido por homens, o número de mulheres presentes ainda é muito pouco em comparação ao de homens. Como menino, mas também LGBT, eu não me conformo que isso seja uma realidade ainda enfrentada pelo Brasil e pelo mundo todo também”, desabafa.

Sua experiência ao lado de pesquisadoras tem sido ímpar, destacando a atuação das professoras Adriana de Jesus Santos, Cleide, Patrícia, Juliana, Adriana Karla e do professor Heriberto. Para João Pedro, a importância do Meninas na Ciência é inegável. “Para mim esse projeto é fundamental para incentivar meninas a participarem efetivamente do meio acadêmico e científico, e estimular também o senso crítico, intelectualidade, opinião própria, e o mais importante que é o conhecimento”, ressalta.

A participação no projeto apenas solidificou sua paixão pela pesquisa e academia, áreas que já almejava seguir. Ele se sente ativamente parte de uma mudança, contribuindo para a promoção da equidade de gênero na ciência. Uma experiência que o marcou profundamente foi durante uma oficina prática. “Uma das alunas agradeceu pela oficina e disse que depois daquele dia e da minha aula ela percebeu que queria ser farmacêutica”, completa João.

Investimento na Permanência e no Futuro

A pesquisadora Cleide Mara Faria Soares também atuou como vice- coordenadora, juntamente com a coordenadora Dra Lisiane dos Santos Freitas, de subprojetos em escolas como o Centro de Excelência Hamilton Alves Rocha e o Centro de Excelência Ofenísia Freire. Seu trabalho gerou pesquisas e resultados notáveis, como o projeto “Potencial Aplicação de Esponjas Adsorventes na Indústria Têxtil”, que obteve destaque em diversas feiras científicas (Feira Científica de Sergipe em 2021, 2022 e 2023), foi finalista na Olimpíada dos Territórios de Sergipe (OTS), premiado na Cienart e selecionado para a 76ª Reunião da SBPC em 2024. A professora Patrícia Andrade, do Centro de Excelência Hamilton Alves, também foi crucial nesse processo.

Com recursos da FAPITEC, o projeto oferece bolsas de incentivo que garantem a permanência das alunas e o fortalecimento de suas trajetórias. São seis bolsas para estudantes do ensino médio e fundamental (R$ 300,00 cada), uma bolsa para graduação (R$ 700,00), uma de mestrado (R$ 2.100,00) e duas bolsas de apoio técnico para professores (R$ 770,00). O valor global do projeto é de R$ 93 mil, destinados à promoção de uma ciência mais diversa, inclusiva e transformadora.

Com base na biotransformação do óleo de licuri, o projeto liderado pela professora Cleide Mara transcende o laboratório e se afirma como uma ação de impacto social e cultural. Alinhado aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU, especialmente os de igualdade de gênero, educação de qualidade e inovação, o “Licuri Sustentável” mostra que investir em meninas é investir no futuro da ciência.

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