“Brasileiros, as Cortes portuguesas querem escravizar-nos e perseguir-nos. De hoje em diante nossas relações estão quebradas. Nenhum laço nos une mais! Viva a independência e a liberdade do Brasil!”. Com estas palavras, ditas em tom de raiva há exatos 201 anos, o então príncipe regente Pedro de Alcântara selou o rompimento definitivo das ligações entre o Estado do Brasil e o Reino de Portugal. Era o desdobramento de uma crise longa e tensa, que resultou na transformação daquela colônia, a mais rica e mais importante do Reino na época, em uma das maiores e mais relevantes nações independentes do mundo.
A Independência, no entanto, foi um processo que não começou e nem se encerrou naquele 7 de setembro de 1822. Entre os séculos 17 e 18, várias revoltas nativistas explodiram na antiga colônia, motivadas por cidadãos insatisfeitos com a intensa exploração dos recursos naturais e da população pela antiga metrópole. A principal delas foi a Inconfidência Mineira, em 1789, na Capitania de Minas Gerais, liderada por Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes.
Em 1808, Portugal foi invadido pela França, ora comandada por Napoleão Bonaparte e que estava em guerra contra a Inglaterra, seu principal aliado. Para não ser capitulado, o rei Dom João VI decide mudar-se com toda a família para o Rio de Janeiro, transferindo a capital do país e elevando posteriormente o Brasil à categoria de Reino Unido à Portugal e Algarves (o que aconteceu em 1815). O então Estado passou a ganhar alguns privilégios até então restritos, como a impressão autorizada de livros e jornais, a abertura dos portos às nações amigas e a criação dos primeiros bancos, fábricas e faculdades.
O jogo virou em 1820, quando uma revolução liberal explodiu na cidade do Porto, norte de Portugal. Cidadãos de todas as camadas sociais constituíram as chamadas Cortes Portuguesas, uma espécie de parlamento local, e exigiram a volta da Família Real para Lisboa. O retorno aconteceu um ano depois, mas o príncipe Pedro, herdeiro do trono, permaneceu no Brasil como regente e começou a contestar algumas determinações, as quais determinavam o fechamento dos portos e a restauração da exclusividade de comércio com o Brasil, dentro do chamado “Pacto Colonial”.
Por outro lado, crescia entre os brasileiros a oposição ao Reino português e o sentimento de que o então Estado já poderia ser uma nação livre. Muitos jornais e panfletos se espalharam pelo território defendendo a independência, assim como as elites locais alarmadas com a ideia de recolonização. A crise atingiu seu ponto máximo em 1822, quando o príncipe Pedro atendeu a um abaixo assinado com mais de 8 mil participantes, que pediam a sua permanência. A este anúncio, em 9 de janeiro, foi atribuída a famosa frase: “Se é para o bem de todos e felicidade geral da nação, diga ao povo que fico!”
As Cortes lusas retaliaram com uma série de cartas enviadas ao Rio de Janeiro. Elas praticamente anularam todas as decisões tomadas pelo príncipe regente e restauraram a validade do Pacto Colonial. Daqui, veio um encaminhamento importante dado pela princesa Maria Leopoldina, esposa de Dom Pedro, e por seu principal conselheiro, José Bonifácio de Andrada e Silva, que considerou tais ordens como “uma declaração de guerra”. Em 2 de setembro, ela convocou um Conselho de Estado e preparou com ele um decreto que definia o Brasil como estado independente, sem responder a nenhuma ordem vinda de Lisboa.
Neste dia, o príncipe estava em viagem a São Paulo e foi informado de toda a situação através das cartas escritas por Leopoldina e Bonifácio, que foram anexadas às ordens das cortes e enviadas por dois oficiais-mensageiros que o alcançaram no dia 7, junto ao riacho do Ipiranga. “Pedro, o Brasil está como um vulcão. Até no Paço há revolucionários. As Cortes portuguesas ordenaram a vossa partida imediatamente, ameaçam-vos e humilham-vos. O Conselho de Estado aconselha-vos a ficar”, dizia a carta da princesa. Da reação furiosa de Pedro, veio a decisão e seu lema: “Independência ou morte!”
Reação e batalhas
Portugal preferiu a morte e se mobilizou para retomar o controle do Brasil. Unidades do Exército leais a Lisboa enfrentaram as que aderiram a Dom Pedro, em uma série de conflitos que se estenderam até 1824 – e que são consideradas por muitos historiadores como Guerras de Independência. Uma das mais sangrentas aconteceu na Bahia, quando em fevereiro de 1822, as forças lusas reprimiram os movimentos de apoio à Independência com muita violência, e acabaram expulsas por tropas formadas no Recôncavo Baiano. A batalha final, em Salvador, foi vencida pelos brasileiros no dia 2 de julho de 1823.
Outro incidente, em março do mesmo ano, foi a Batalha do Jenipapo, no Piauí, que opôs o governador da capitania, João da Cunha Fidié, contra a população local. Nas batalhas em Oeiras, Parnaíba e Campo Maior, mais de 200 pessoas morreram. As tropas lusas chegaram a vencer os brasileiros, mas foram atacadas com força ao seguirem para Maranhão, o que levou Fidié e seus homens a se renderem, em 28 de julho.
No mês seguinte, em um episódio que ficou conhecido como “Adesão do Pará”, os exércitos de Dom Pedro rumaram para o Grão-Pará e subjugaram o governo local, que era abertamente pró-Lisboa. E em março de 1824, a então Província Cisplatina (atual República Oriental do Uruguai), cujo comandante era o português Álvaro da Costa, foi a última a aderir ao Brasil, após um cerco militar de vários dias contra sua capital, Montevidéu.
Portugal só reconheceu oficialmente a independência de sua ex-colônia em 1825, após a intermediação da Inglaterra e o pagamento de uma indenização de 2 milhões de libras esterlinas. A crise terminou, mas o processo de independência foi continuando ao longo da história, e as feridas entre Brasil e Portugal foram sendo curadas, transformando a relação em uma longa e duradoura amizade.
com informações de Alesp, Band e UOL Educação
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