O velho ditado que ensina ser “melhor prevenir do que remediar” faz bastante sentido em questões que envolvem a saúde e o bem-estar das pessoas, apesar de não ser seguido à risca por muitos. O senso comum da população ainda associa o momento de procurar o médico (ou qualquer profissional de saúde) apenas quando se sente sintomas de alguma doença ou problemas de saúde. Isso se percebe principalmente em casos de doenças consideradas “previsíveis”, ou seja, que podem se agravar devido ao ignorar de alguns sintomas ou sinais de alerta emitidos pelo próprio organismo. Esse comportamento pode ser explicado pelo frenético e intenso ritmo da vida moderna, entre outros fatores.
“A constante pressão por produtividade e a demanda por proatividade levam muitas vezes à negligência das necessidades psíquicas e somáticas, que são fundamentais para a manutenção da saúde. Fatores como estresse crônico, falta de sono, alimentação inadequada, sedentarismo e ausência de momentos de relaxamento contribuem para o enfraquecimento do sistema imunológico e aumento da vulnerabilidade a doenças. Em outras palavras, a priorização constante da produtividade em detrimento do bem-estar físico e mental cria um ambiente propício ao surgimento de problemas de saúde”, diz o professor Estélio Henrique Martin Dantas, do Programa de Pós-Graduação em Biociências e Saúde (PBS) e dos cursos de Medicina e Educação Física da Universidade Tiradentes (Unit).
Mas o que faz uma doença ser “previsível”, isto é, passível de ser evitada? De acordo com Estélio, tal consideração pode acontecer quando fatores de risco conhecidos aumentam significativamente a probabilidade de seu desenvolvimento. “Isso é particularmente verdadeiro para as doenças crônicas não transmissíveis (DCNTs), como doenças cardiovasculares, diabetes tipo 2, alguns tipos de câncer e doenças respiratórias crônicas. Essas doenças resultam geralmente de uma combinação de fatores genéticos, estilo de vida e ambientais, sendo que a previsibilidade reside na capacidade de identificar e monitorar esses fatores de risco”, alerta o professor, citando que este fato é corroborado por diversos estudos científicos.
Tais estudos atestam ainda que as ações e intervenções focadas em melhorar o estilo de vida, como alimentação equilibrada, atividade física regular e a abstenção do tabagismo, bem como o controle do estresse e o desenvolvimento da espiritualidade, contribuem para reduzir o risco de desenvolver DCNTs ou minimizar seus impactos.
“A capacidade de modificar esses comportamentos oferece uma ferramenta muito mais poderosa do que a intervenção sobre os fatores genéticos. Por exemplo, o tabagismo é um fator de risco previsível para DPOC e diversos tipos de câncer, mas a cessação do hábito pode drasticamente reduzir esse risco, independentemente da predisposição genética. Assim, a previsibilidade dessas doenças permite intervenções eficazes focadas na modificação do estilo de vida para promover a saúde e a longevidade”, afirma Estélio, acrescentando que o tratamento de problemas de saúde futuros pode consumir tempo, recursos e afetar negativamente a qualidade de vida, trazendo altos custos físicos, emocionais e financeiros.
O “ser saudável”
O conceito de “vida saudável” vai muito além da simples ausência de doenças, outra ideia definida pelo senso comum. Trata-se de uma condição que engloba a capacidade de ter autonomia funcional no dia a dia, permitindo que a pessoa trabalhe, se relacione com a família e os amigos, e tenha disposição para usufruir do lazer.
Para o professor Estélio, o “ser saudável” se caracteriza pela presença de uma sensação de bem-estar físico e mental, permitindo que a pessoa desfrute da vida e realize suas atividades cotidianas com energia, facilidade e satisfação. “Isso inclui também a capacidade de encontrar prazer no trabalho que realiza, o que contribui para a produtividade e a sensação de recompensa, fortalecendo ainda mais o bem-estar geral. É um estado dinâmico, que requer atenção contínua e cuidado com todos os aspectos da saúde, física e mental”, diz ele.
Aqui se estabelece uma diferença crucial entre o “cuidar da doença”, que se baseia na resolução de problemas de saúde após o aparecimento deles, com medidas corretivas e paliativas; e o “manter-se saudável”, que implica em manter uma postura proativa e preventiva, voltada para a promoção do bem-estar e a prevenção de doenças. Esta diferenciação é bem explicada na chamada Teoria do Autocuidado, desenvolvida pela enfermeira norte-americana Dorothea Orem (1914-2007). Segundo ela, manter-se saudável envolve ações contínuas para promover a saúde, o desenvolvimento e o funcionamento ótimo do organismo, indo além da mera ausência de doença e considerando todos os aspectos da vida, incluindo alimentação, exercício físico, saúde mental e bem-estar social.
Adotar ações proativas e preventivas é um passo importante que cada pessoa pode dar para recuperar a sua condição de “ser saudável”, o que requer, muitas vezes, um processo profundo e transformador de reestruturação do estilo de vida. “Não se trata apenas de adotar algumas mudanças superficiais, mas sim de integrar hábitos saudáveis em todos os aspectos da vida, de forma sustentável. A jornada para a recuperação da saúde envolve a identificação dos fatores que contribuíram para o desequilíbrio, e a adoção de estratégias para corrigir esses pontos”, afirma Estélio, indicando que o processo pode ser facilitado com acompanhamento profissional especializado para ajudar na definição de metas, no desenvolvimento de planos de ação personalizados e no monitoramento do progresso.
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